Entre Sem Bater - Franz Kafka - Festa à Fantasia

Entre Sem Bater – Franz Kafka – Festa à Fantasia

Entre sem Bater

Este é um texto da série “Entre sem bater” ( Uma leitura, acima de tudo, “obrigatória”). A cada texto, uma frase, citação ou similar, que nos levem a refletir. É provável que muitas destas frases sejam do conhecimento de muitos, mas deixaremos que cada um se aproprie delas. Entretanto, algumas frases e seus autores podem surpreender a maioria dos leitores. Vivemos uma verdadeira “Festa à Fantasia” ao contrário do que Kafka disse, ninguém se envergonha, pelo contrário.

Cada publicação terá reprodução, resumidamente, nas redes sociais Pinterest, Facebook, Twitter, Tumblr e, eventualmente, em outras isoladamente.

As frases com publicação aqui têm as mais diversas origens. Com toda a certeza, algumas delas estarão com autoria errada e sem autor com definição. Assim sendo, contamos com a colaboração de todos de boa vontade, para indicar as correções.

Na maioria dos casos, são frases provocativas e que, surpreendentemente, nos dizem muito em nosso cotidiano. Quando for uma palavra somente, traremos sua definição. Em caso de termos ou expressões peculiares, oferecemos uma versão particular. Os comentários em todas as redes sociais podem ter suas respostas em cada rede e/ou com reprodução neste Blog.

Franz Kafka

Se Kafka fosse vivo, reviraria, com toda a certeza, no túmulo cada vez que alguma de suas ideias sofrem deturpação. Eu diria que o escritor austro-tcheco, de origem judaica, tinha pensamentos muito adiante de seu tempo. Franz Kafka escreveu, mais de 100 anos atrás, sobre a louca “Geração Perdida(1) da qual ele fazia parte. Desse modo, a partir de “O Processo” e “A Metamorfose” podemos afirmar que Kafka está atualizadíssimo e ainda vivemos uma festa à fantasia(*)?

Franz Kafka ( 3 de julho de 1883 – 3 de junho de 1924 ) foi um romancista e contista boêmio de língua alemã baseado em Praga. Reconhecido como uma das principais figuras da literatura do século XX . Seu trabalho funde elementos do realismo e do fantástico. Ele normalmente apresenta protagonistas isolados enfrentando situações bizarras ou surrealistas e poderes socioburocráticos incompreensíveis . Explorava temas de alienação, ansiedade existencial , culpa e absurdo. Seus trabalhos mais conhecidos incluem o conto ” A Metamorfose ” e os romances “O Processo” e “O Castelo”. O termo kafkiano entrou no inglês para descrever situações absurdas, como as retratadas em seus escritos.  

Fonte: Wikipedia

Festa à Fantasia

Vivemos em um mundo onde as aparências não apenas enganam, mas definem. A frase de Kafka torna-se real e mais forte do que nunca na era digital. Atualmente, não se trata mais de uma festa à fantasia com máscaras temporárias e que poucos são os convidados. Com efeito, a fantasia tornou-se um estado permanente, uma condição existencial que contamina toda a estrutura social.

A ilusão tomou conta de tal forma que muitos não apenas vestem a fantasia, mas passam a crer que ela é sua verdadeira identidade. E esse autoengano está apodrecendo nossa sociedade e moldando novas gerações incapazes de encarar a realidade.

A Ilusão Digital

As redes sociais são vitrines artificiais que exibem apenas o que é conveniente para cada perfil em suas bolhas. Com filtros, edições e narrativas proselitistas, cada indivíduo constrói um personagem ideal, que, sem dúvida, não reflete quem ele realmente é. Em outras palavras, a fantasia que cada um veste nas redes sociais é aquilo que cada um gostaria de ser. O problema não está apenas na construção dessa identidade fictícia, mas no fato de que a própria pessoa passa a acreditar nela.

O efeito é devastador: a autenticidade se torna obsoleta, e a verdade sucumbe em favor de uma performance que precisa de validação constante.

O perigo maior reside na interiorização dessa farsa. Não se trata apenas de parecer um idiota feliz(2) ou influente para os outros. Trata-se, outrossim, de convencer a si mesmo e aos seguidores de que isso é a realidade. Dessa forma, a vida se transforma em um palco, uma fantasia, onde ninguém se permite ser vulnerável ou falho. Em suma, qualquer desvio da narrativa ideal transforma-se em um fracasso irreparável que deveria não ser assim.

A Cultura do Desejo Inatingível

A sociedade atual rege-se por padrões que a era digital os elevou a um nível inatingível. Agora, não basta ser belo, é preciso ser impecável e digno da idolatria de estultos. Não basta ser feliz, é necessário exibir a felicidade em cada postagem com uma fantasia que convença as pessoas. Não basta ter sucesso, é essencial que ele pareça fácil, sem esforço e escondendo dos pobres como atingi-lo. Isso gera uma corrida insana pelo inalcançável, onde cada um tenta superar não apenas os outros, mas a versão utópica de si mesmo.

Assim sendo, essa lógica produz ansiedade, depressão e um vazio existencial sem precedentes, digno dos pensamentos de Kafka. As novas gerações crescem acreditando que a vida tem tudo da perfeição e que qualquer dificuldade ou sofrimento são falhas pessoais.

Enfim, qual é o resultado que veremos?

Uma sociedade frágil, incapaz de lidar com frustrações e que busca anestesia constante, fantasia para qualquer evento e ignorância coletiva. Assim sendo, compartilhar e curtir, além do consumismo sem limites e até mesmo outros desvios, viram “normalidade”..

O Mercado da Ilusão

A fantasia tornou-se um produto altamente lucrativo. A indústria da estética, a publicidade, os influenciadores digitais e até mesmo o setor de desenvolvimento pessoal lucram com a insegurança das pessoas. Criam-se problemas inexistentes para vender fantasias e soluções mágicas.

Quer amor das pessoas? Compre este curso de carisma. Quer que outros desejem você? Use esse produto milagroso. Quer ter o respeito alheio? Invista neste estilo de vida e aparências. As pessoas gastam fortunas em procedimentos estéticos, roupas de grife, viagens exibicionistas. São, com toda a certeza, experiências que servem mais para reforçar sua identidade digital do que para proporcionar satisfação real.

E a engrenagem continua girando, sempre insaciável, sempre exigindo mais aparências e fantasias.

A Falência da Realidade e o Colapso Social

Se a vida real se torna insuportável diante da perfeição encenada, o que resta? Muitos preferem se retirar para o mundo digital, onde existem controles, filtros e maquiagem em excesso. Por isso vemos a destruição do senso de comunidade, de pertencimento e de empatia. As relações interpessoais tornam-se superficiais, pois ninguém quer se conectar verdadeiramente, apenas exibir uma versão editada de si mesmo.

A consequência disso é uma sociedade alienada, onde a comunicação se dá por meio de performances e não de trocas genuínas. Onde amizades, relacionamentos e até mesmo laços familiares se fragilizam diante da necessidade de manter a ilusão. Onde as novas gerações crescem sem referências reais de identidade, pois só conhecem a si mesmas através daquilo que postam.

Resgatando a Verdade

A saída para essa espiral de autoengano e decadência social exige coragem. Precisamos resgatar o valor da autenticidade, da imperfeição e da vulnerabilidade. É necessário ensinar às novas gerações que a vida não é uma fantasia ou um espetáculo. É, inquestionavelmente, uma jornada de altos e baixos, onde falhar é humano e essencial para o crescimento de cada pessoa.

As redes sociais, apesar de seu efetivo potencial destruidor, podem ter uma utilização mais consciente. Em outras palavras, devemos questionar o que consumimos, buscar conexões reais e aprender a diferenciar o que é encenação do que é genuíno. Mais do que isso, é preciso redefinir nossos valores: substituir a busca incessante por aprovação pela valorização daquilo que é verdadeiro.

Kafka sentiu vergonha por ter ido de cara limpa a uma festa à fantasia. Atualmente, a vergonha maior seria o contrário: a de jamais permitirmos que nos vejam como realmente somos. Se continuarmos a viver por trás de uma máscara ou fantasia, corremos o risco de não reconhecermos mais a nossa própria face.

Existe alguma saída?

 

Amanhã tem mais … 

P. S.

(*)  Autenticidade, inclusão, pertencimento, diversidade e atitudes semelhantes estão perdendo espaço para tudo que nega a razão de existir do coletivo.

(1)Entre Sem Bater – Franz Kafka – Geração Perdida

(2) “Entre Sem Bater – Tati Bernardi – O Idiota Feliz

 

Imagem: Entre sem bater – Franz Kafka – Festa à Fantasia

Nota do Autor

Reitero, dentre outras, o pedido feito em muitos textos deste blog e presente na página de “Advertências“.

  • Os textos de “Entre sem bater” são opinativos/informativos, inquestionavelmente com o objetivo de estimular a reflexão e o debate.
  • Sugestões, indicações de erro e outros, uma vez que tenham o propósito de melhorar o conteúdo, são importantes. Basta enviar e-mail para pyxis at gmail.com, página do Facebook, associada a este Blog, ou perfil do Twitter, Threads, etc.
  • Alguns textos sofreram revisão, outros ainda apresentam erros (inclusive ortográficos) e sofrerão correção à medida que se tornam erros graves (inclusive históricos).
  • Algumas passagens e citações podem parecer estranhas, mas fazem parte ou referem-se a textos ainda inéditos.