Dura Lex
Conforme o tradutor do Google, a frase em latim “Dura Lex, sed lex” tem uma tradução como “a lei dura, mas a lei“. Contudo, o jeitinho brasileiro coloca artigos, vírgulas e apensos que flexibilizam tudo. No Brasil, à princípio, esta célebre frase de cunho jurídico tá mais para o “para os amigos tudo, para os inimigos os rigores da lei“. E, surpreendentemente, em ano de eleições “gerais”, o que vejo em relação a calamidade das enchentes que afligem baianos e mineiros, é o arrepio da lei.
Enchentes
Calamidade
Em primeiro lugar, é muito fácil identificar uma calamidade. É aquilo que pode ser atribuído às forças da natureza e que, na maioria dos casos, atinge pessoas menos favorecidas. Sob todos os aspectos, até quando uma calamidade atinge a camada da sociedade com posses e poder, os resultados são diferentes.
Por exemplo, se as enchentes são em áreas de risco, não existe vítimas que tenham muitos recursos financeiros. Eles nunca estarão em áreas de risco e, inegavelmente, sairão da área antes do sinistro. No caso de uma calamidade provocada por um tsunami, ou vulcão, os efeitos serão diferenciados em função da classe social.
Desse modo, as enchentes deste início de ano eleitoral, que causa vítimas, inclusive fatais, em Minas e na Bahia, são cruéis.
Dura Lex, Sed Lex
É neste momento que cruzamos com a lei que deveria ser para todos, mas passa longe disso.
Vamos supor que todas as classes sociais paguem, por exemplo, o IPTU progressivo e proporcional às suas habitações e ocupações. Assim sendo, os serviços públicos e as condições oferecidas pelo Poder Público (Município, estados e União) deveriam ser equilibrados. Entretanto não é assim que acontece.
É neste momento que aparece a legislação eleitoral que veda a transferência de verbas e recursos públicos às pessoas. Aí entra a exceção prevista.
Conforme o artigo 73 da Lei 9504/97, não pode ” a distribuição gratuita de bens e serviços de caráter social custeados pelo Poder Público “. Entretanto, uma brecha (ou várias) podem virar as famosas exceções.
“Art. 73 § 10. No ano em que se realizar eleição, fica proibida a distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios por parte da Administração Pública, exceto nos casos de calamidade pública, de estado de emergência ou de programas sociais autorizados em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior, casos em que o Ministério Público poderá promover o acompanhamento de sua execução financeira e administrativa. (Incluído pela Lei nº 11.300, de 2006)
§ 11. Nos anos eleitorais, os programas sociais de que trata o § 10 não poderão ser executados por entidade nominalmente vinculada a candidato ou por esse mantida. (Incluído pela Lei nº 12.034, de 2009)”.
Reprodução www.jus.com.br
Em outras palavras, o jeitinho, desde que sejam enchentes com característica de calamidade, resolve o assunto eleitoral e das verbas. Importante ressalta que crimes como o ocorridos em Mariana(1) e Brumadinho, são vistos como acidentes e a história muda muito.
Malditas Enchentes; Benditas Enchentes
Nesse ínterim, entram as exceções como a antecipação do “Vale Gás” para a maioria dos atingidos e vulneráveis diante da calamidade. Como se não bastasse, o Governo Federal lida com o assunto à distância, com o Presidente da República de férias no sul do país. É claro que o verão e seca no sul do país é aproveitado por todos, afinal as enchentes são tragédias de mineiros e baianos.
Com o propósito de atender as vitimas das enchentes, estabelece-se o fato da excepcionalidade. Com efeito, ato contínuo, prefeitos saem à cata de verbas que fogem da lei eleitoral e promovem a caridade. Não precisa licitação, pode gastar tudo que recebe e um pouco mais e tudo com justificativas legais.
Fundo Eleitoral
É importante ressaltar que, para as eleições de 2022, o Fundo Eleitoral tem recursos da ordem de 6 Bilhões de Reais. Certamente, nem um mísero centavo destes recursos são destinados às vítimas das enchentes. Enquanto o Governo Federal libera em torno de R$47 milhões(2) o Governo Estadual anuncia R$603 milhões(3) para as cidades atingidas.
O curioso é que existem muitos critérios para recebimento de verbas, com certeza não presentes nas matérias dos meios de comunicação. Por outro lado, bem ao estilo Maquiavel de fazer o bem, doses homeopáticas de bondade serão destaque.
Verba para vítimas
Os anúncios de liberação de verbas se sucedem, o Governador de Minas, Romeu Zema, faz questão de falar do que pode capitalizar na eleição. Dá ênfase ao valor que uma família pode receber sem, no entanto, dizer os critérios para as famílias se beneficiarem.
Ao mesmo tempo, deixam de anunciar que estão revogando os descontos do ICMS dos combustíveis, o que provocará novos aumentos.
Prefeituras ficam com o pires na mão à espera das verbas federais e estaduais. Governadores (em Minas, na Bahia e outros estados), anunciam verbas como se fossem recursos estaduais.
A questão da diferença de valores, e do percentual destas verbas, em relação ao Fundo Partidário viram questões menores. É provável que exista algum político que esteja pensando: “por que esta bendita enchente não foi na minha cidade“. É compreensível então o comportamento dos vereadores de Belo Horizonte. Pouco depois das enchentes anos atrás, vetaram o pedido do prefeito para contrair empréstimo e evitar enchentes na cidade.
As enchentes podem ser malditas, e realmente são, mas dependendo de pontos de vistas e Interesses peculiares, são até benditas e louvadas. Com toda a certeza, as verbas destinadas às vítimas das enchentes podem fazer muita diferença no pleito de outubro.
Enfim, benditas enchentes que vão injetar alguns milhões nas combalidas economias dos municípios, mesmo com os desvios.
(1) “Não foi acidente – O crime do século“
(3) “Zema anuncia repasse de R$560 mi para cidades atingidas pelas chuvas em Minas”
Imagem: Luidgi Carvalho (Ag Estado)
Nota do Autor
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