Entre sem Bater
Este é um texto da série “Entre sem bater” ( ← Uma leitura, acima de tudo, “obrigatória” ). A cada texto, uma frase, citação ou similar, que nos levem a refletir. É provável que muitas destas frases sejam do conhecimento dos leitores, mas deixaremos que cada um se aproprie delas. Entretanto, algumas frases e seus autores podem surpreender a maioria dos leitores. Ser uma pessoa “Totalmente Ignorante“, atualmente, é uma realidade da maioria, que Aleck Bourne não previu.
Cada publicação terá reprodução, resumidamente, nas redes sociais Pinterest, Facebook, Twitter, Tumblr e, eventualmente, em outras isoladamente.
As frases com publicação aqui têm as mais diversas origens. Com toda a certeza, algumas delas estarão com autoria errada e sem autor com definição. Assim sendo, contamos com a colaboração de todos de boa vontade, para indicar as correções.
Na maioria dos casos, são frases provocativas e que, surpreendentemente, nos dizem muito em nosso cotidiano. Quando for uma palavra somente, traremos sua definição. Por isso, em caso de termos ou expressões peculiares, oferecemos uma versão particular. Os comentários em todas as redes sociais podem ter suas respostas em cada rede e/ou com reprodução neste Blog.
Aleck Bourne
Algumas frases e pensamentos, foram, na divulgação do contexto original, pragmáticas e não filosóficas. É provável que Aleck Bourne nunca imaginaria que sua frase seria uma espécie de slogan para os tempos atuais. Inquestionavelmente, nunca antes na história da humanidade, um indivíduo é totalmente ignorante com tanta informação à disposição.
Aleck William Bourne (4 de junho de 1886 – 30 de dezembro de 1974) foi um proeminente ginecologista e escritor britânico. Mais conhecido por seu julgamento de 1938, um caso histórico, no qual foi processado por interromper a gravidez em uma vítima de estupro de 14 anos. Posteriormente, ele foi acusado de realizar um aborto ilegal, mas foi absolvido. Mais tarde, ele se tornou um ativista antiaborto.
Fonte: Wikipedia (Inglês)
Totalmente Ignorante
Da mesma forma que Aleck Bourne teve um julgamento e absolvição a partir de uma espécie de ignorância coletiva, vivemos um mundo de julgamentos. Em outras palavras, a ignorância da citação de Bourne expandiu e superou todos os limites da racionalidade. Atualmente, qualquer ser, totalmente ignorante, se julga no direito de, a partir de informação errada, praticar julgamentos e condenações.
Eventos recentes, no Brasil, como a pandemia, a política eleitoral, a política econômica, elevaram à condição de julgadores verdadeiros ignorantes. Temas como imunologia, meio ambiente, política de relações exteriores exibem “especialistas” nas redes sociais que assustam.
Como se não bastasse, a ignorância não faz distinção entre a informação falsa (fake news) e os fatos verificáveis. O que Bourne imaginou como a mente das pessoas, virou o “Google”. Analogamente ao conceito de usar um alicate para desapertar um parafuso, o brasileiro utiliza o Google para amenizar sua ignorância.
“Um milhão de fatos”
Há mais de oito décadas, uma afirmação intrigante ecoou na mente de poucos:
“É possível armazenar na mente um milhão de fatos e ainda assim ser totalmente ignorante.”
Essa frase ganhou o mundo e serve de uma espécie de slogan, atualmente. Contudo, vivemos uma nova interpretação que se ajusta ao contexto da era digital. Hoje em dia, existe uma quantidade infinita de informações acessíveis através do Google e outras ferramentas online. Desse modo, o que deveria servir para refletirmos sobre a forma como interagimos com o conhecimento virou arma dos ignorantes.
Inegavelmente, através de um simples clique, temos à nossa disposição uma vastidão de dados e informações, mas não o conhecimento. O alcance destas ferramentas, como o Google, é tão amplo que podemos equiparar a um “armazenamento de um milhão de fatos“.
No entanto, uma pergunta crucial é: como estamos utilizando essa riqueza de informações?
A resposta, inquestionavelmente, é desanimadora e muitos acham que é pessimismo ou falta de esperança na humanidade.
A facilidade de acesso à informação levou a uma paradoxal extinção de atos como a reflexão e comedimento.
Desse modo, como as pessoas frequentemente confundem quantidade com qualidade, a posse ou acesso a informações não é indicativo de conhecimento. Grupos e plataformas de redes sociais se tornaram o paraíso deste tipo de ignorância coletiva. Repetem-se as versões, ignoram-se os fatos, todos já têm “opinião formada”, de segunda mão(1), e se acham sábios.
Deficiência Informacional
Assim sendo, o acesso quase ilimitado à informação nos fez passar da escassez à abundância em um piscar de olhos ou num clique. Entretanto, muitos estão perdidos nesse mar de dados, incapazes de discernir o que é relevante e confiável sobre coisas que não são.
A incapacidade de filtrar informações úteis que são enganosas ou irrelevantes contribui para a produção de alguém totalmente ignorante. O problema não é a falta de informações, mas sim a incapacidade quase geral de processá-las de maneira consistente. Um dos fatores para isso é a “necessidade” de ser ágil nas manifestações, para se mostrar “por dentro” das novidades.
A deficiência de ignorância informacional traduz-se pela incompetência de usar um vasto conjunto de informações ao alcance de todos.
Desse modo, são várias as manifestações desta posição totalmente ignorante, quais sejam:
- Propagação da desinformação;
- Falta de discernimento na tomada de decisões;
- Intolerância à informações antagônicas;
- Manipulação de massas(2).
Dá um Google
A capacidade de pesquisa instantânea do Google pode nos fazer sentir onipotentes. Contudo, na realidade, precisamos ser mais críticos e seletivos em relação às informações que recebemos dos algoritmos. É público e notório que a pessoa totalmente ignorante que não sabe como escrever uma pesquisa ou pergunta receberá lixo como resposta.
Desta forma, afirmamos que a ignorância informacional tem relação direta com a superficialidade do conhecimento básico.
A facilidade de buscar respostas rápidas, sem dúvida, faz com que muitos de nós nos contentamos com informações superficiais ou falsas.
Surpreendentemente, em vez de aprofundar nosso entendimento sobre um tópico, paramos no que aparece na primeira página do Google.
Responda para você mesmo, das 100 últimas vezes, quantas pesquisas você fez no Google e foi além da terceira página?
Por isso, temos uma compreensão rasteira da maioria dos assuntos, o que, por sua vez, pode levar à disseminação de opiniões errôneas.
Educação Digital
Como se não bastasse, a ênfase na quantidade de informações muitas vezes negligencia a importância da reflexão e da análise crítica. A educação digital mal entrou na pauta e sofreu um atropelamento pelo imediatismo dos “influencers” e pregadores.
Certamente, a mera acumulação de fatos não contribui para o desenvolvimento de habilidades de pensamento crítico ou educação digital(3). A capacidade de formar julgamentos com qualidade não depende da quantidade de mensagens que recebemos das redes sociais. Ter um milhão de fatos ou mensagens repetitivas não equivale a possuir sabedoria ou conhecimento.
Desse modo, muitos que tentam ser influenciadores pautam a forma e impõem o conteúdo de seus guetos digitais. A maioria dos ignorantes não saberão que a verdadeira sabedoria reside na capacidade de refletir e aplicar qualquer conhecimento.
Em nossa busca frenética por informações, surpreendentemente, esquecemos a importância da educação e da aprendizagem contínua. A informação por si só não é uma panaceia para a ignorância individual ou coletiva. O processo de aprendizagem, a busca pela compreensão e a aplicação do conhecimento é que permitem evoluirmos.
Ignorância Plena
Em suma, o acesso ilimitado à informação através de algoritmos e outras ferramentas nos dá a ilusão de que não somos ignorantes. Entretanto, a verdadeira questão é como estamos usando, compartilhando e refletindo sobre toda essa informação.
A explosão de ignorância não está na falta de informações, mas sim na falta de discernimento, reflexão e análise crítica.
Ter um milhão de fatos à disposição não nos torna saudáveis mentalmente. A sabedoria reside na capacidade de aplicar esse conhecimento de maneira relevante a cada contexto e realidade. Portanto, devemos reafirmar que a verdadeira busca pelo conhecimento requer não apenas acesso, mas também discernimento e reflexão.
Enfim, é uma certeza que armazenar milhões de fatos na mente possibilita ser totalmente ignorante na Era da Informação. As pessoas não querem compreender as coisas(4), querem somente serem ágeis para demonstrar sua ignorância.
(1) “Entre sem bater – Mark Twain – Segunda Mão”
(2) “Hegel e a manipulação de massas”
(3) “Adestramento digital dos 8 aos 80”
(4) “Entre sem bater – Upton Sinclair – Compreender as Coisas”
Imagem: Entre sem bater – Lênin – O Poder do Dinheiro
Nota do Autor
Reitero, dentre outras, o pedido feito em muitos textos deste blog e presente na página de “Advertências“.
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