Entre sem Bater
Este é um texto da série “Entre sem bater” ( ← Uma leitura, acima de tudo, “obrigatória” ). A cada texto, uma frase, citação ou similar, que nos levem a refletir. É provável que muitas destas frases sejam do conhecimento dos leitores, mas deixaremos que cada um se aproprie delas. Entretanto, algumas frases e seus autores podem surpreender a maioria dos leitores. A “Incompetência“, sem dúvida, é algo que consegue uma cumplicidade em qualquer hierarquia, e Laurence J. Peter expôs isso.
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As frases com publicação aqui têm as mais diversas origens. Com toda a certeza, algumas delas estarão com autoria errada e sem autor com definição. Assim sendo, contamos com a colaboração de todos de boa vontade, para indicar as correções.
Na maioria dos casos, são frases provocativas e que, surpreendentemente, nos dizem muito em nosso cotidiano. Quando for uma palavra somente, traremos sua definição. Por isso, em caso de termos ou expressões peculiares, oferecemos uma versão particular. Os comentários em todas as redes sociais podem ter suas respostas em cada rede e/ou com reprodução neste Blog.
Laurence J. Peter
É provável que Laurence J. Peter fosse daqueles que seguiam a ideia de que até a verdade pode estar numa ironia ou sarcasmo. Eu diria que sua obra mais famosa encaixa-se como uma luva nos tempos atuais das redes sociais onde reina a incompetência. Embora possa ser um paradoxo, os pensamentos de Laurence encaixam-se nos maiores “cases” de sucesso da rede mundial .
Laurence J. Peter, nascido em 16 de setembro de 1919, Vancouver (CAN) e falecido em 12 de janeiro de 1990, Palos Verdes Estates (EUA). Professor canadense e autor do livro best-seller “O Princípio de Peter: Por que as coisas sempre dão errado” (1969). Peter foi educado nos Estados Unidos no Western Washington State College (BA, 1957; MA, 1958) e no Washington State College (Ph.D., 1963). Lecionou na University of British Columbia antes de se tornar professor de educação no sul da Califórnia (1966–70). Escreveu O Princípio de Peter com Raymond Hull; que era para ser uma sátira sobre suas experiências com burocracias educacionais e outras. Sua tese central era que “… numa hierarquia, todo funcionário tende a subir ao seu nível de incompetência”. Depois de ser rejeitado por 30 editoras, vendeu oito milhões de exemplares e foi traduzido para 38 idiomas. Peter escreveu mais oito livros, incluindo The Peter Prescription (1972) e Peter’s Quotations (1977), na mesma veia satírica. Também produziu um estudo sério em quatro volumes, “Competências para o Ensino : Sistemas de Responsabilidade para a Formação de Professores” (1975).
Fonte: Britannica (Inglês)
Incompetência
Os pensamentos de Laurence, mesmo aqueles presentes nos estudos sérios, servem como diagnóstico da incompetência que grassa, atualmente, no mundo. Somos incompetentes e coniventes até reverenciarmos aqueles que se tornam nossos “mitos” e ídolos. Por outro lado, ao identificarmos incompetências que não se alinham com nossos limites, criticamos e nos transformamos em alvos. Os seguidores de incompetentes de sucesso adoram cancelar quem aponta qualquer incompetência.
Desse modo, aquilo que Laurence J. Peter identificou no meio educacional e nas organizações, tem uma reprodução fiel no mundo virtual.
Algumas, na realidade seriam muitas, das frases de Laurence merecem análises e contextualizações para a atualidade.
Partido Político
“Um partido político existe agora principalmente como um aparelho para selecionar candidatos e elegê-los para cargos públicos.”
O Princípio de Peter: Por que as coisas sempre dão errado”
Essa frase, certamente, não é uma obra de ficção política distópica, mas é uma descrição precisa da política eleitoral no Brasil da atualidade. A ironia, nesse caso, não é um fato de que os partidos, que deveriam representar os interesses do povo, agora são máquinas eleitorais autossustentáveis.
No Brasil e talvez no mundo inteiro, sem dúvida, a política, inclusive eleitoral, se transformou em um jogo de estratégias questionáveis. E longe de serem incompetentes, os partidos lutam para ver quem consegue montar uma coalizão mais ampla e rentável. A incompetência tem sua confirmação quando não conseguem uma reeleição ou se apontam os dedinhos sujos sem sucesso. O que importa não são mais os valores ou programas partidários, mas sim o poder de atração de caciques políticos. Como se não bastasse, a capacidade de barganha para conquistar tempo de TV e recursos do fundo partidário justificam os meios.
De pai para filho
Essa ironia se aprofunda quando a democracia serve mais como palco para ambições pessoais e para as manter as oligarquias partidárias. Anteriormente, escrevi sobre o negócio, de pai para filho(1), que se tornou a política, sem sucesso editorial.
A polarização extrema, as alianças de conveniência e os escândalos de corrupção são apenas alguns dos sintomas desse problema. Com efeito, reinam a competência eleitoral e incompetência total com o objetivo que deveria nortear a democracia e a política.
A escolha de candidatos não surge por critérios de competência, integridade ou representatividade, mas sim em acordos e conchavos políticos. A população sempre se vê diante de opções cuja origem está nos comitês de estrategistas eleitorais e, desse modo, faz as piores escolhas.
Democracia Guiada
Nesse cenário, a tragicomédia atinge o seu ápice, pois os partidos políticos se distanciam cada vez mais daqueles a quem deveriam servir, o povo. O resultado é a democracia frágil e cheia de vícios, com a política se tornando um jogo de cartas marcadas. E, como se não bastasse, os interesses do povo ficam num segundo plano, e viram interesses de seguidores de redes sociais.
Em suma, a política eleitoral no Brasil, em sua atual encarnação, é uma ironia triste e amarga. Resultado da incompetência dos eleitores, que transformam a política em jogo de interesses em detrimento do bem-estar coletivo.
Resta saber se um dia essa ironia perecerá, em prol de uma democracia representativa, competente e responsiva aos anseios da sociedade.
Mundo Digital
“O computador, assim como um humano, está sujeito ao “Princípio de Peter”. Se inicialmente fizer um bom trabalho, há uma forte tendência a promovê-lo para tarefas de maior responsabilidade, até atingir o seu nível de incompetência.”
O Princípio de Peter: Por que as coisas sempre dão errado”
Inquestionavelmente, as plataformas digitais desempenham um papel cada vez mais importante em nossa sociedade. Desse modo, é provável que pessoas de todo o mundo se conectem, compartilhem informações e expressem suas opiniões por modismo. Contudo, como em qualquer sistema, elas também estão sujeitas a uma dinâmica peculiar que lembra o “Princípio de Peter”.
Os seres humanos, no ambiente profissional, têm promoções até atingirem seu nível de incompetência condizente com seus superiores. Analogamente, as plataformas digitais elevam indivíduos incompetentes ao status de “top voices” em função de seus seguidores que não pensam.
Essa analogia se torna evidente quando observamos como as plataformas digitais funcionam. Inicialmente, aqueles que adquirem conteúdo valioso e significativo ganham destaque e seguidores. Isso é semelhante a uma promoção por fazer um único bom trabalho em uma empresa ou por esconder as incompetências profissionais.
No entanto, à medida que ganham visibilidade e seguidores, alguns indivíduos podem começar a se aventurar em áreas onde não têm expertise real. E aqui é onde o “Princípio de Pedro” entra no jogo e sua ideia sobre “computadores” serem incompetentes alinha-se com a Internet atual. Plataformas digitais, como o LinkedIn(2), ultrapassaram todos os limites da racionalidade e sensatez. Abandonaram o objetivo de ser um ambiente que priorize os profissionais para ganhar audiência com proselitistas incompetentes.
Plataformas Digitais
À medida que esses perfis alcançam um status nestas plataformas, começam a falar sobre uma ampla variedade de tópicos que não dominam. Assim sendo, independentemente de sua competência real, eles tornam-se referência para qualquer assunto.
Por exemplo, um sujeito (ou perfil) que é economista, resolve falar sobre política eleitoral e fazer proselitismo(3). Desse modo, a disseminação de informações incorretas, desinformação e até mesmo opiniões falsas, torna-se viral. Contudo, devido à sua popularidade inicial, eles continuam a atrair seguidores e atenção, criando um ciclo falacioso.
Essa dinâmica não apenas afeta as qualidades do discurso e narrativas na Internet, mas também pode ter consequências graves para a sociedade. A divulgação de informações errôneas influenciam a tomada de decisões, prejudicam a compreensão pública de questões importantes e outros conflitos.
Assim sendo, é fundamental que estas plataformas mitiguem o impacto dos “Princípios de Peter”. Devem promover a responsabilidade, a competência e a expertise em suas comunidades ao invés da incompetência e conivência. Isso inclui promover a verificação de fatos, a moderação imparcial e o apoio a vozes verdadeiramente competentes. Desse modo, será possível às plataformas digitais cumprirem sua promessa de facilitar o diálogo construtivo e o compartilhamento de conhecimento.
O Princípio de Peter
Os pensamentos e princípios de Laurence J. Peter, podem parecer ironias fora de contexto. Entretanto, como na frase-tema, eles não conhecem barreiras de tempo e lugar. Surpreendentemente, as redes sociais e a Internet que deram voz ao “idiota da aldeia“, elevaram os incompetentes ao sucesso.
Com toda a certeza, uma grande maioria dos leitores deste texto que chegarem até este final num ato de bravura e incompetência, dirão:
– É inveja !
Não se reprimam, podem dizer, gritem, mas entrem na fila do pão, é para isso que serve a série “Entre sem bater“. Se ao menos 1% dos leitores, que discordam de tudo, inclusive dos “princípios” de Peter, refletirem, a semente está germinando. E assim, de um modo mais difícil do que uma viralização pueril, mas lucrativa, das redes sociais, poderemos evoluir.
Um dia atingiremos o nível de incompetência que preconizou Laurence J. Peter, e estaremos no “top voices” destas plataformas. Ficou muito fácil enganar as pessoas e a incompetência transformar-se em competência e até mesmo sucesso.
Muitas outras frases e pensamentos de Laurence J. Peter poderiam ter espaço nesta ideia de incompetência ampla, geral e irrestrita. Entretanto, seria necessário mais do que um post, talvez um compêndio geral do tema, o que seria possível somente com muitas mãos ajudando. Quem sabe, num futuro próximo, e após muitos de nós refletirmos sobre o grau de cumplicidade sobre o tema, possamos avançar.
Por isso as coisas dão errado, maldita inclusão digital !
(1) “Um negócio (ótimo) de pai para filho”
(2) “Pecados Digitais – A Soberba”
(3) “Entre sem bater – Pietro Ubaldi – O Proselitismo”
Imagem: Entre sem bater – Laurence J. Peter – A Incompetência
Nota do Autor
Reitero, dentre outras, o pedido feito em muitos textos deste blog e presente na página de “Advertências“.
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