Entre sem Bater
Este é um texto da série “Entre sem bater” ( ← Uma leitura, acima de tudo, “obrigatória” ). A cada texto, uma frase, citação ou similar, que nos levem a refletir. É provável que muitas destas frases sejam do conhecimento dos leitores, mas deixaremos que cada um se aproprie delas. Entretanto, algumas frases e seus autores podem surpreender a maioria dos leitores. É, inquestionavelmente, sem nenhuma racionalidade, a oposição aos pensamentos de Maria Montessori, especialmente o “Educar” para a paz.
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Na maioria dos casos, são frases provocativas e que, surpreendentemente, nos dizem muito em nosso cotidiano. Quando for uma palavra somente, traremos sua definição. Por isso, em caso de termos ou expressões peculiares, oferecemos uma versão particular. Os comentários em todas as redes sociais podem ter suas respostas em cada rede e/ou com reprodução neste Blog.
Maria Montessori
O preconceito contra as crianças(1) sob educação pelo Sistema Montessori, que vivenciei, foi cruel. Logo após a minha adolescência, talvez já como adulto, é que fui perceber a importância desta educadora extraordinária. A excepcional estudiosa tentou, em tempos dificílimos, praticar a educação e a paz, mas ainda hoje, não tem a compreensão dos pais(*). Surpreendentemente, até profissionais que se apresentam como educadores não aceitam as ideias desta maravilhosa pensadora.
Maria Montessori, (nascida em 31 de agosto de 1870, Chiaravalle, perto de Ancona, Itália – falecida em 6 de maio de 1952, Noordwijk Aan Zee, Holanda). Educadora italiana e criadora do sistema educacional que leva seu nome. O Sistema Montessori baseia-se na crença no potencial criativo das crianças, no seu desejo de aprender e no direito de cada criança ser tratada como um indivíduo. Depois de se formar em medicina pela Universidade de Roma em 1896 – a primeira mulher na Itália a fazê-lo – Montessori foi nomeada médica assistente na clínica psiquiátrica da Universidade de Roma, onde se interessou pelos problemas educacionais das crianças com deficiência intelectual. Entre 1899 e 1901 atuou como diretora da Escola Ortofrênica Estatal de Roma, onde seus métodos se mostraram extremamente bem-sucedidos. De 1896 a 1906 ocupou uma cátedra de higiene num colégio feminino em Roma, e de 1900 a 1907 lecionou pedagogia na Universidade de Roma, ocupando uma cátedra de antropologia de 1904 a 1908. Durante esses anos ela continuou seus estudos de filosofia, psicologia e educação.
Fonte: Britannica.Com
Educar
A educação sempre foi uma arte intrínseca ao desenvolvimento humano. Educar é um processo que molda mentes, valores e culturas. Na antiguidade, essa arte era um privilégio de poucos, restrita a elites que detinham o conhecimento como símbolo de poder e status. Surpreendentemente, na era da informação, o conhecimento continua com a mesma simbologia, e muito mais acessível.
Em civilizações como a grega e a romana, por exemplo, filósofos, estudiosos e professores apresentavam-se como guardiões do saber. Desse modo, transmitiam seus ensinamentos e parte do conhecimento a poucos discípulos. Certamente, a tradição oral e escrita era uma forma de preservar e disseminar a sabedoria, mas com extremas limitações de acesso a essas fontes.
No Oriente, especialmente em culturas como a chinesa, a arte de educar sempre obteve grande reverência e respeito. Confúcio, um dos maiores filósofos da China, considerava a educação essencial para o desenvolvimento moral e social. O respeito pelo professor era absoluto, e a sala de aula era um sacro espaço onde o conhecimento passava de geração em geração. Esse profundo respeito pela educação como uma arte nobre permanece até hoje em muitas culturas orientais. Em algumas delas, os educadores são figuras de grande respeito e a busca pelo conhecimento tem mais valor do que as aparências.
Tempos Modernos
Com o advento da modernidade e a massificação do acesso à educação, o cenário, atualmente, mudou drasticamente. A revolução industrial, informacional e o avanço tecnológico possibilitaram a democratização do ensino. Desta forma, a educação transformou-se em um direito fundamental, acessível a milhões de pessoas e necessário às nações. Assim sendo, a escola pública e a educação obrigatória surgiram como pilares das sociedades modernas. Portanto, ampliou-se o acesso ao conhecimento e é possível que mais indivíduos desenvolvam suas habilidades e potencialidades.
Contudo, essa democratização trouxe consigo desafios significativos e até mesmo surreais e cruéis. A massificação da educação, embora positiva em muitos aspectos, resultou na diluição da percepção da educação como uma arte. O sistema educacional contemporâneo frequentemente prioriza a quantidade sobre a qualidade.
Desta forma, as abordagens, como educar para a paz e harmonia, deram lugar ao educar para que cada indivíduo seja competitivo.
A ênfase em métricas de desempenho e resultados a partir de padrões, sem dúvida, igualou cada indivíduo como massa não pensante. Professores sofrem, frequentemente, com grandes turmas, pressões administrativas inúteis e desigualdade de ensino. Por isso, a grande limitação da capacidade do educador em exercer a docência de maneira criativa e inspiradora.
Como se não bastasse, a cultura ocidental valoriza mais as conquistas materiais e aparências do que o desenvolvimento intelectual e moral. Por outro lado, há um contraste com a visão oriental que prejudica todas as ações educacionais que desejamos. Ao invés da educação como um meio para atingir a harmonia e o equilíbrio pessoal e social, só vemos a competição. Essa diferença de valores contribui para a falta de respeito e apreciação pela educação como uma arte na sociedade ocidental contemporânea.
Educar para a Paz
Montessori viveu durante um período turbulento – passou por duas guerras mundiais – e dominou a arte de educar as crianças. Seu trabalho e suas ideias, sem dúvida, tiveram como base a violência e os conflitos que ela testemunhou. Desse modo, é compreensível a sua defesa fervorosa da educação para a paz.
A visão de Montessori sobre a educação transcende a simples transmissão de conhecimento. Ela via a escola como um microcosmo da sociedade, onde a paz e o respeito mútuo deveriam ser o pilar, desde a tenra idade. Em um mundo onde, atualmente, as guerras religiosas(2) são a causa das divisões e violência, as suas ideias são inquestionáveis. E, notadamente, se avaliarmos no contexto de um estado laico, como o Brasil, torna-se vital compreender esta arte, sem proselitismos.
Os conflitos religiosos entre monoteístas, como os enfrentamentos entre diferentes denominações cristãs, islâmicas e judaicas, são a fonte das guerras. Tais conflitos não só prejudicam a coexistência pacífica destes grupos, mas demonstram a necessidade de educar para a tolerância. Além disso, deveriam promover a compreensão e o respeito pela diversidade religiosa, dentre outras diferenças.
A abordagem de Montessori à arte de educar é uma ferramenta poderosa, que forma cidadãos que valorizam a paz e a convivência respeitosa.
Brasil Laico?
No Brasil, um país constitucionalmente laico deveria existir a liberdade religiosa, de expressão e de associação. Entretanto, querem mudar a constituição e o papel da educação, impondo este ou aquele livro religiosos na educação infantil.
A situação chegou a tal ponto de surrealismo que os pais tentam incluir, nas lições de evolução da espécie, a opção de “Adão e Eva”. Os negacionistas e fanáticos religiosos segregam qualquer professor que colocar a opção de origem humana cristão como erro na resposta. Alguns municípios legislam, sobretudo, pelas concepções religiosas de vereadores, num desrespeito à Constituição e à população.
A Constituição Brasileira assegura a todos os indivíduos o direito de praticar sua religião livremente, sem imposição ou discriminação. No entanto, a simples existência de tais garantias legais não é suficiente para assegurar uma sociedade verdadeiramente inclusiva e pacífica. É necessário que os princípios de respeito e tolerância estejam presentes nas escolas, especialmente as públicas.
A Arte de Educar
Nesse ínterim, de uma revolução neopentecostal, a arte de educar torna-se mais importante do que nunca. Enquanto livros religiosos têm seu lugar e valor em contextos pessoais e comunitários, a educação pública deve se concentrar em princípios universais. Com toda a certeza, a convivência pacífica e o respeito aos direitos individuais devem prevalecer. As iniciativas de pregadores de púlpitos e condutores de seitas devem sofrer limitações. A preguiça mental(3) que assola a maioria dos habitantes da esgotosfera precisa sofrer mudanças.
O método Montessori, com seu foco no desenvolvimento integral do indivíduo e na promoção de uma cultura de paz, é a solução. Ao enfatizar o respeito mútuo e a responsabilidade social, educar para a paz prepara as crianças serem adultos independentes.
Além disso, um estado laico deve garantir que a educação pública seja neutra em relação a qualquer religião específica. Desta forma, irá promover um ambiente onde todas as crenças, ou a ausência delas, possam ter o igual respeito. Isso não significa excluir o ensino sobre religiões, mas sim abordá-las para a compreensão intercultural e a coexistência pacífica. O respeito à diversidade religiosa deve ser um pilar da educação, alinhado com os princípios constitucionais de liberdade e igualdade.
Reconhecimento e Respeito
Em suma, a ideia de educar para a paz, defendida por Maria Montessori, é mais relevante do que nunca nos dias de hoje. Um estado laico, onde a liberdade religiosa e a educação inclusiva sejam prioridade é essencial. A arte de educar, a partir dos princípios do Sistema Montessori, é a chave para alcançar essa visão de uma sociedade em evolução.
Enfim, a educação, embora acessível a muitos hoje, não recebe o tratamento de arte e respeito que merece. Recuperar essa visão artística da educação exige uma mudança cultural que valorize a sabedoria, o desenvolvimento integral do indivíduo. Em outras palavras, o papel insubstituível dos educadores não pode se confundir com influenciadores e pregadores de redes sociais. Pais responsáveis precisam descobrir a essência da educação como um processo criativo, transformador e profundamente humano. Educar e aprender são atos de profunda significância e beleza, que devem ter reconhecimento e respeito de toda a sociedade.
“Amanhã tem mais …”
P. S.
(*) Pais, de uma ou duas gerações anteriores, respeitavam os educadores, mesmo com métodos arcaicos. Atualmente, desrespeitam educadores e pensam que pagando, os educadores devem fazer o que eles querem e não a melhor educação.
(1) “Entre Sem Bater – Maria Montessori – As Crianças“
(2) “Entre Sem Bater – Schopenhauer – As Guerras Religiosas”
(3) “Entre sem bater – Liz Hurley – Preguiça Mental“
Imagem: Entre sem bater – Maria Montessori – Educar para a Paz
Nota do Autor
Reitero, dentre outras, o pedido feito em muitos textos deste blog e presente na página de “Advertências“.
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