Entre sem Bater
Este é um texto da série “Entre sem bater” ( ← Uma leitura, acima de tudo, “obrigatória” ). A cada texto, uma frase, citação ou similar, que nos levem a refletir. É provável que muitas destas frases sejam do conhecimento dos leitores, mas deixaremos que cada um se aproprie delas. Entretanto, algumas frases e seus autores podem surpreender a maioria dos leitores. Em tempos de muitas mentiras, “Mentir um Pouco” nem parece que é um pecado, ainda mais se a Adélia Prado disse.
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As frases com publicação aqui têm as mais diversas origens. Com toda a certeza, algumas delas estarão com autoria errada e sem autor com definição. Assim sendo, contamos com a colaboração de todos de boa vontade, para indicar as correções.
Na maioria dos casos, são frases provocativas e que, surpreendentemente, nos dizem muito em nosso cotidiano. Quando for uma palavra somente, traremos sua definição. Por isso, em caso de termos ou expressões peculiares, oferecemos uma versão particular. Os comentários em todas as redes sociais podem ter suas respostas em cada rede e/ou com reprodução neste Blog.
Adélia Prado
Adélia nasceu na mesma data em que minha mãe nasceu (13 de dezembro), por isso era Luzia como a minha mãe. A luz da poetisa ainda brilha muito. A poetisa do oeste bravio recebeu o elogio do governador mineiro(*) (Zema) por trabalhar na “rádia” da cidade onde mora. Surpreendentemente, tal “deferência” teve lugar num programa onde as coisas de Divinópolis estavam sendo exaltadas. É mais uma das estultices que estas invenções miraculosas provocam. Mas Adélia Prado é forte e, certamente, encarou esta situação como um chiste, sem ódio e sem rancor. Adélia, perdoai nosso governador, ele e os seguidores dele não sabem o que dizem e que mentir é pecado.
Adélia Luzia Prado Freitas (nascida em 13 de dezembro de 1935) é uma escritora e poetisa brasileira. Ela nasceu em Divinópolis, Minas Gerais, onde ainda mora. Foi a primeira de sua família a frequentar uma universidade, graduando-se em Filosofia e Ensino Religioso pela Universidade de Divinópolis. Lecionou na escola até 1979 e foi representante cultural da Cidade de Divinópolis de 1983 a 1988. Seu trabalho é um aparente paradoxo de um catolicismo profundo e espiritual combinado com o físico e o carnal. Ela mesma tentou resolver esta contradição, escrevendo que “É a alma que é erótica”. O trabalho de Adélia Prado também foi publicado em tradução na The Paris Review, Antaeus, Field e American Poetry Review. Foi incluída na Antologia Ecco de Poesia Internacional e no Livro Farrar Straus Giroux de Poesia Latino-Americana do Século XX. Em 2024 foi galardoada com o Prémio Camões.
Fonte: Wikipédia (Português)
Mentir um Pouco
Desde que comecei com a trilha e textos “Entre Sem Bater” evito mentir, ao menos descaradamente. Por outro lado, o tema “mentirosos”(1) e tudo que se relacione à fake news e mentiras é recorrente. Está, sem dúvida, impossível falar de qualquer coisa, ler qualquer notícia ou até pensar sem que fiquemos em dúvida sobre o que é verdade.
Os efeitos das redes sociais sem controle estão aí, para quem quiser ver, ou para quem defende que mentir um pouco “faz parte”. É provável que muitas pessoas e personagens encontraram nas plataformas digitais seu ambiente propício para um “match“. Podemos afirmar que, sem medo de errar ou não recebermos a compreensão de todos, vivemos um verdadeiro inferno digital.
Inferno Digital
A frase de Adélia Prado, embora aparentemente simples, carrega uma profundidade que nos convida a refletir sobre a verdade e a mentira. Ao contextualizarmos essa citação nos dias atuais, especialmente no cenário das redes sociais, podemos observar uma série de nuances. A reflexão sobre a frase na atualidade, deveria nos ajudar a compreender os ritmos velozes e o descontrole dos discursos e narrativas irreais.
Digam se não vivemos no inferno digital(2) que faria Dante ruborizar?
Na era digital, vivemos imersos em um mar de informações que fluem incessantemente através de diversas plataformas. As redes sociais, em particular, se tornaram um palco onde discursos que se erguem, se destroem e reconstroem a uma velocidade espantosa. Nesse ambiente, a mentira muitas vezes encontra um terreno fértil para se disseminar sem limites e sem pudor. Surpreendentemente, seja por motivos pessoais, políticos, econômicos ou simplesmente pela busca de atenção, é a realidade.
Por exemplo, alguém, até com boas intenções, reproduz alguma coisa que achou legal ou útil. Pode ser uma notícia de segurança ou alguma arte que chegou até o seu perfil. Na ânsia de querer se apresentar como o cara “in“, esta pessoa reproduz e compartilha, desmedidamente. E, do mesmo modo, alguém, no milésimo de segundo seguinte, alguém pesquisa e prova que mentir nem sempre tem pernas curtas.
A mentira pode ter, ou melhor, tem, inquestionavelmente, pernas curtíssimas …
Necessidade de Mentir
Adélia Prado, ao falar da necessidade de mentir um pouco, sugeriu algo sobre os ritmos de como as narrativas e discursos(3) se construíam. Na literatura, e, certamente na vida, a narrativa precisa de elementos que transcendam a realidade pura e simples para se tornar compreensível. Desta forma, esse “mentir um pouco” é como uma licença poética, uma maneira de dar vida e ritmo à comunicação.
No entanto, nas redes sociais, essa ideia apresenta-se com distorções e longe de qualquer poesia.
As mentiras e desinformações não são mais ferramentas para enriquecer uma narrativa, mas sim armas para manipulação e enganação(4). A velocidade com que as informações se espalham na internet dificulta o controle e a verificação dos fatos. Um boato ou uma notícia falsa pode alcançar milhões de pessoas em questão de minutos. Por outro lado, a verdade tem um ritmo muito mais lento para se propagar e refutar os efeitos de se mentir.
Os propagadores de “fake news“, tornaram-se mais ativos do que nunca, numa necessidade de mentir incompreensível e insana. Eles usam e abusam dos algoritmos das redes sociais para alcançar audiências maiores, até mesmo sem saber como funcionam. Como se não bastasse, exploram vieses cognitivos e emocionais das pessoas de maneira inumana.
Em suma, alguns estudos mostram que notícias falsas têm 70% mais chances de compartilhamento do que as verdadeiras, é factual. A possibilidade de evocar reações emocionais mais fortes, como surpresa, medo ou indignação são determinantes. Em um ambiente onde a atenção é um recurso valioso, a mentira, muitas vezes, parece ser uma moeda de troca muito mais eficaz.
Verdade Básica
Um personagem filósofo dos tempos modernos digitais disse: “… a única verdade básica(4) é que todo mundo mente …”.
Essa proliferação de inverdades têm consequências reais, cruéis, perversas e profundas. Afeta desde decisões políticas e eleições até a saúde pública e a coesão social. A pandemia de COVID-19 é, por exemplo, um modelo de como a desinformação traz perigos até para vidas humanas.
Teorias da conspiração e mentiras sobre a doença e as vacinas se espalharam rapidamente. Desse modo, influenciaram o comportamento das pessoas e, em muitos casos, levando a consequências trágicas. Assim sendo, podemos dizer que mesmo mentir um pouco tem, atualmente, um viés de crime.
Motivações Sinistras
Mas por que as pessoas mentem tanto nas redes sociais?
A resposta não é simples, mas envolve uma combinação de fatores psicológicos, sociais e tecnológicos. O anonimato e a distância física, que a Internet proporciona, reduzem a inibição, e os indivíduos sentem-se livres para mentir ou distorcer a verdade. Além disso, a busca por validação e reconhecimento, incentiva a criação de conteúdos sensacionalistas e, não raramente, falsos.
Ao mesmo tempo, as plataformas de redes sociais, que visam maximizar o engajamento, priorizam conteúdos que geram mais interações. Desta forma, a veracidade do conteúdo pouco ou nada importa. Isso cria um círculo vicioso onde as mentiras recebem recompensas por ter maior visibilidade e atingir mais pessoas.
Este tipo de situação torna não somente os conteúdos sinistros, mas as pessoas que utilizam deles são sinistras.
Navegar é Preciso
Assim sendo, até entender o próprio tempo e o próprio discurso pode parecer complexo e quanto mais mentirmos, piora.
Então, como podemos navegar nesse mar de informações e desinformações?
É provável que uma alfabetização midiática ou educação básica digital se torne uma disciplina essencial, desde a infância. Por isso, devemos cultivar a habilidade de pensar criticamente sobre o que lemos e compartilhamos. Adicionalmente, virtualmente ou no mundo real, devemos verificar as fontes de informação e buscar múltiplas perspectivas sobre tudo. Afinal, antes de aceitar algo como verdade, devemos refletir e utilizar o cérebro para pensar, é da natureza humana.
Adélia Prado, com toda a certeza, na sua sabedoria poética, nos lembra que mentir, numa forma benignamente artística, pode ter um propósito. Contudo, devemos estar atentos para não sermos cúmplices de uma mentira que empobrece o discurso e a compreensão mútua.
Precisamos, em suma, encontrar um novo ritmo, onde a verdade, mesmo que menos imediata ou emocionante. É somente através de uma comunicação honesta e responsável que podemos, certamente, construir uma sociedade mais justa e mais poética.
“Amanhã tem mais …”
P. S.
(*) O governador não tem nem a dimensão do que o Prêmio Camões para Adélia Prado significa. Se tivesse, lavaria a boca e colocava algum auxiliar para planejar uma homenagem para a poetisa maior mineira.
(1) “Entre Sem Bater – Epicteto – Os Mentirosos“
(2) “Entre Sem Bater – Virgílio – Inferno Digital“
(3) “Entre Sem Bater – Michel Foucault – O Discurso“
(4) “Entre Sem Bater – Jacques Abbadie – A Lei do Engano“
(5) “Entre Sem Bater – Md House – A Verdade Básica“
Imagem: Entre sem bater – Adélia Prado – Mentir um Pouco
Nota do Autor
Reitero, dentre outras, o pedido feito em muitos textos deste blog e presente na página de “Advertências“.
- Os textos de “Entre sem bater” são opinativos/informativos, inquestionavelmente com o objetivo de estimular a reflexão e o debate.
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