Entre Sem Bater – Banda Eva – A Aventura Humana na Terra

Entre sem Bater

Este é um texto da série “Entre sem bater” (← Uma leitura, acima de tudo, “obrigatória”). A cada texto, uma frase, citação ou similar, que nos levem a refletir. É provável que muitas destas frases sejam do conhecimento de muitos, mas deixaremos que cada um se aproprie delas. Entretanto, algumas frases e seus autores podem surpreender a maioria dos leitores. A “Aventura Humana” na Terra teve seu espaço numa poesia que a Banda Eva cantou e canta até hoje, é um hino do Carnaval.

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Na maioria dos casos, são frases provocativas e que, surpreendentemente, nos dizem muito em nosso cotidiano. Quando for uma palavra somente, traremos sua definição. Em caso de termos ou expressões peculiares, oferecemos uma versão particular. Os comentários em todas as redes sociais podem ter suas respostas em cada rede e/ou com reprodução neste Blog.

Banda Eva

O Axé é, sem dúvida, a mola propulsora do carnaval na Bahia. Embora os trios elétricos sejam mais antigos, foi a 40 anos atrás que o ritmo soteropolitano embalou o Brasil. É provável que, à época, bons ventos sopravam na política do país, em relação às eleições. Por outro lado, a economia não parecia bem e as novidades em termos musicais no Carnaval não existiam. Desse modo, o Axé, ao contrário de outros ritmos que surgiram depois, explodiu o carnaval do país. Assim, a aventura humana na Terra Brasilis dava sinais de estar viva.

A Banda Eva é uma banda de axé brasileira. Iniciou-se em 1977 como um grêmio estudantil, o Eva se tornou um bloco carnavalesco em 1980, desfilando pelas ruas de Salvador anualmente comandando por diversos artistas conceituados como Luiz Caldas, Ricardo Chaves, Durval Lélys e outros, apenas nos cinco dias de Carnaval. Em 1993, visando o alcance do projeto, o Eva virou uma banda, a qual estreou liderada por Ivete Sangalo. Após três anos de sucesso no nordeste, o grupo ganhou destaque nacional em 1996, com o disco Beleza Rara. Na sequência, tornou-se um dos maiores nomes do axé, com a faixa-título “Eva“. Com a saída de Ivete, três anos depois, Emanuelle Araújo assume os vocais. Apostando em um vocal masculino para renovar a imagem da banda e evitar novas controvérsias com o público, Saulo Fernandes assume os vocais, ficando por onze anos, deixando a banda no Carnaval de 2013. Naquele ano Felipe Pezzoni assumiu os vocais. Desde 1993 a Banda Eva vendeu 8 milhões de discos, responsável pela descoberta e lançamento de grandes nomes da música – cantores e músicos – e um dos blocos mais tradicionais do Carnaval de Salvador.

Fonte: Wikipédia (português)

A Aventura Humana

A música que narra o fim da aventura humana na Terra é da música “Eva”^(*). A letra, de autoria de Giancarlo Bigazzi e Umberto Tozzi, tem versão de Marcos Ficarelli. Certamente, 99% ou mais, das pessoas que cantam a música que fala do fim da aventura humana nunca ouviram a Eva⁽¹⁾ original. Adicionalmente, poucos se importam com o contexto em que a música teve origem e sua composição surgiu. Entretanto, devemos dar o mérito a quem fez a versão e o produtor que teve o insight de colocar na Banda Eva.

Em um desses fóruns digitais, a letra da música (versão de Ficarelli) apresentou-se para um debate. As interpretações literais são, inquestionavelmente, pérolas da “sabedoria” popular brasileira de quem não gosta de ler/ouvir e pensar. Assim sendo, vamos para mais um texto que aproveita o fim do Carnaval (#SQN). Constatamos, de fato, que o fim da aventura humana na Terra foi em 2012⁽²⁾.

Arca de Noé

Na Arca de Noé cabem muitos bichos, casais, na maioria dos casos, que nem sempre pensam igual ou concordam em todas as coisas. Desta forma, é natural que as pessoas, notadamente brasileiros, tenham reações das mais diferentes em relação à música. A letra, de Umberto Tozzi, carrega uma mistura de elementos bíblicos com uma visão apocalíptica do fim do mundo. Em outras palavras, um contraste do clima festivo do Carnaval brasileiro com dogmas cristãos.

A música surgiu em um momento de grande tensão global, no final da Guerra Fria, quando o medo de ataques nucleares era real. Assim sendo, a letra apresenta-se com certa ansiedade, falando sobre o fim da aventura humana na Terra. E, sem dúvida, sugere a necessidade de se escapar para um novo começo em algum outro lugar. A referência à Arca de Noé e aos personagens bíblicos Adão e Eva sugere uma busca por salvação e renovação em um mundo apocalíptico.

O fim da Aventura Humana

“Meu amor, olha só hoje o sol não apareceu
É o fim da aventura humana na Terra
Meu planeta adeus,
Fugiremos nós dois na arca de Noé
Olha bem meu amor no final da odisseia terrestre“

Nesta estrofe, o compositor expressa um sentimento de desespero e perda diante do fim do mundo. A imagem do sol não aparecendo simboliza a perda de esperança e luz. A menção à Arca de Noé é uma metáfora para a busca por salvação, enquanto a comparação com Adão e Eva sugere um novo início. No contexto da Guerra Fria, essa estrofe é uma reação ao medo de destruição nuclear, e a busca pela  sobrevivência.

No Brasil, especialmente durante o Carnaval, essa estrofe apresenta-se de maneira mais simbólica e metafórica. O “fim da aventura humana” traduz-se pelo fim das preocupações cotidianas. Por outro lado, a “Arca de Noé” é o símbolo da busca por um refúgio seguro, onde as pessoas querem só celebrar a vida. A música, presente em um ambiente festivo, transforma o sentimento de desespero em uma celebração da vida e do amor.

A Redução da Terra a Nada

“… E pelo espaço de um instante
Afinal não há nada mais que o céu azul…
Sobre o Rio, Beirute ou Madagascar
Toda a Terra reduzida a nada, a nada mais
E minha vida é um flash
de controles, botões antiatômicos …”

Neste trecho, a letra destaca, a princípio, a fragilidade da vida diante das ameaças nucleares. A imagem do céu azul é um contraste com a destruição. A menção a cidades como Rio, Beirute e Madagascar sugere, por exemplo, uma visão global da catástrofe. A vida sendo um “flash” de controles antiatômicos reforça a ideia de que tudo pode acabar em um instante.

No contexto brasileiro, essa estrofe pode ser uma reflexão sobre a importância de viver o momento presente, ou tipo “ligar o foda-se“. A “Terra reduzida a nada” pode simbolizar a capacidade de esquecer as preocupações mundanas durante o Carnaval. O “céu azul” representa, com toda a certeza, a ideia de liberdade e a alegria, mesmo que falaciosas ou efêmeras. A menção a cidades ao redor do mundo indicam uma celebração da diversidade e da união global, mesmo em um ambiente festivo. Interessante observar que nem mesmo a falsa ausência de preconceitos apresenta-se como problema na versão brasileiro.

Tudo são flores, falsas e hipócritas, mas é Carnaval e vale-tudo, literalmente.

Carnaval

A música “Eva”, certamente, é um exemplo fascinante de como uma canção pode ter múltiplas interpretações dependendo do contexto. Originalmente, a letra reflete o medo e a ansiedade do fim da Guerra Fria. Enquanto isso, a versão no Brasil, durante o Carnaval, se transforma em uma celebração da vida e do amor.

Na versão da Banda Eva, se tornou um hino do Carnaval brasileiro, a princípio em Salvador e depois no país inteiro. Vários são os elementos que a tornam icônica e cativante para o público. Alguns dos principais fatores que contribuem para essa popularidade. A inclusão do ritmo do gênero Axé e de instrumentos de percussão deram à música um caráter festivo e “chiclete” de celebração coletiva.

A música “Eva” é uma presença obrigatória nos trios elétricos, blocos de rua e festas durante o Carnaval ou nas micaretas Brasil afora. Como se não bastasse, a música se tornou um símbolo de inclusão e união, convidando todos a participarem da festa. Desse modo, o convite para todos se sentirem parte da cultura baiana e de ritmos afro, é cativante. Isso tudo reforça sempre uma energia positiva e um clima de celebração.

Em suma, a combinação do ritmo cativante, da adaptação ao contexto brasileiro e a presença no Carnaval foi lapidar. Com efeito, a capacidade de unir as pessoas cantando um hino, tornam “Eva” um hit indiscutível da maior festa do Brasil.

 

⁽²⁾ “O Fim do Mundo Maia e a Inversão dos Pólos”