Entre sem bater - Chico César - Os Neutros

Entre sem bater – Chico César – Os Neutros

Entre sem Bater

Este é um texto da série “Entre sem bater” ( Uma leitura, acima de tudo, “obrigatória” ). A cada texto, uma frase, citação ou similar, que nos levem a refletir. É provável que muitas destas frases sejam do conhecimento dos leitores, mas deixaremos que cada um se aproprie delas. Entretanto, algumas frases e seus autores podem surpreender a maioria dos leitores. É provável que os “Neutros” discordem do resumo que Chico César fez sobre a atitude deles, e comprovarão que o compositor acertou.

Cada publicação terá reprodução, resumidamente, nas redes sociais Pinterest, Facebook, Twitter, Tumblr e, eventualmente, em outras isoladamente.

As frases com publicação aqui têm as mais diversas origens. Com toda a certeza, algumas delas estarão com autoria errada e sem autor com definição. Assim sendo, contamos com a colaboração de todos de boa vontade, para indicar as correções.

Na maioria dos casos, são frases provocativas e que, surpreendentemente, nos dizem muito em nosso cotidiano. Quando for uma palavra somente, traremos sua definição. Por isso, em caso de termos ou expressões peculiares, oferecemos uma versão particular. Os comentários em todas as redes sociais podem ter suas respostas em cada rede e/ou com reprodução neste Blog.

Chico César

A entrevista na qual Chico César verbalizou o pensamentos sobre os neutros vai muito além deste pensamento. Ele fala da neutralidade, da arte e da política e como as manifestações dos artistas não devem atuar na neutralidade. Em suma, quando ele diz que “… não existe neutralidade na vida, na ética, na poética e na política ...” o recado é inequívoco. Desse modo, o artista pensador reforça a proposta de inexistência de uma posição para os neutros se esconderem.

Francisco César Gonçalves (Catolé do Rocha, 26 de janeiro de 1964), conhecido pelo nome artístico Chico César, é um cantor, compositor, escritor e jornalista brasileiro. Aos dezesseis anos mudou-se para João Pessoa. Formou-se em jornalismo pela Universidade Federal da Paraíba. Na época da universidade, entrou para o grupo Jaguaribe Carne, onde fazia poesia de vanguarda. Aos 21 anos, mudou-se para São Paulo e trabalhou como jornalista e revisor de textos da Editora Abril. Em 1991, deixou o jornalismo para dedicar-se somente à música. Em 1995 lançou seu primeiro disco “Aos Vivos” e seu primeiro livro “Cantáteis, cantos elegíacos de amizade” (ed. Garamond). Tornou-se conhecido em 1996 pela canção “Mama África“.  O videoclipe da música ganhou o prêmio de “Melhor Videoclipe de MPB” no MTV Vídeo Music Brasil (VMB) de 1997.

Fonte: Wikipedia (Português)

Os Neutros

Em primeiro lugar e antes de mais nada, deixo o registro de que a frase e pensamentos de Chico César são de uma finesse ímpar. Um filósofo popular, se não disse, diria:

Neutro é sabão ou detergente. Em política não tem neutro, o nome é conivente ou covarde“.

Contudo, prosseguindo na verve cuidadosa de Chico César, podemos dizer que os neutros têm, dentro de si, o dilema da imparcialidade conveniente.

A frase ressoa de forma impactante nos tempos modernos, especialmente nas redes sociais e plataformas digitais, onde reina a hipocrisia(1). À princípio, a ideia de neutralidade parece ter um viés ético, objetivando não tomar partido em questões polêmicas. Entretanto, quando examinamos detidamente, confirmamos que os aqueles que se autoproclamam neutros têm, na verdade, um lado. E, surpreendentemente, escolheram não divulgar seu lado ou preferência, para não desagradar a audiência.

As situações vão muito além da política, religião ou futebol. No futebol, por exemplo, a neutralidade é uma falsa imparcialidade, com estes ou aqueles comentaristas não declinando seu time do coração. Desse modo, o profissional imagina que a não declaração de sua paixão tornará sua opinião mais confiável. Por outro lado, ele continuará comentando com a camisa por baixo do uniforme da emissora que trabalha.

Com toda a certeza, existem razões possíveis para as pessoas tentarem se passar por neutras. Contudo, o “normal” e mais hipócrita nas redes sociais é cada um ter o seu lado e não demonstrar qual é, sempre que possível.

Dilemas e razões

As justificativas para se posicionar como neutro, em qualquer assunto ou debate, são comuns à maioria das pessoas. Como se não bastasse, os neutros costumam atacar aqueles que têm um posicionamento, quando não concordam com a ideia. A válvula de escape dos neutros é sempre algum ataque às pessoas e não às ideias, senão a máscara cai. Por isso, as razões para que os neutros sejam assim, são bons motivos para abrir um debate e desmascará-los, com argumentos e sem ataques pessoais.

Evitar Conflitos

Uma das razões mais óbvias para alguém tentar se passar por neutro nas redes sociais é evitar conflitos e consequências negativas. Sem dúvida, em um ambiente onde as discussões são “quentes”, permanecer neutro é uma maneira segura de evitar atritos com outras pessoas.

A exposição a críticas, cancelamento ou perda de seguidores é uma preocupação real para muitos e evitar debates resolve este problema. A neutralidade aparente pode ser uma estratégia para evitar os debates fervorosos e radicais que frequentemente ocorrem online.

Aparência de Imparcialidade

Outra motivação forte para explicar a pretensa neutralidade é a busca por uma imagem de imparcialidade. Alguém que deseja parecer equilibrado e objetivo deve aparentar neutralidade, mesmo que tenha fortes convicções pessoais sobre a pauta. Desse modo, é um comportamento comum nas figuras públicas, influencers e empresas que desejam atrair seguidores autômatos e neutros.

O desejo de ampliar seu público seguidor, com diversidade, exige não ter ênfase em nenhuma polêmica. Manter a aparência de imparcialidade pode ser uma estratégia de marketing (pessoal e comercial) para ampliar a quantidade de seguidores.

Represálias ou Intolerância

É provável que esta razão faça algum sentido mais próximo da realidade. Grupos e plataformas criaram teorias do cancelamento que praticam a intolerância e autoritarismo sem meias medidas. Por exemplo, se você está num grupo de rede social que os “donos” ou capatazes digitais(2) são onipotentes, sofrerá retaliação se “sair da linha“.

Em muitas situações, indivíduos temem represálias ou intolerância por parte de grupos extremistas ou radicais que defendem opiniões firmes e rígidas. Portanto, em contextos políticos, alguém pode evitar expressar sua opinião de forma aberta se perceber que isso pode colocar em risco sua integridade.

Desse modo, a falsa sensação de neutralidade pode ser cruel, pois na verdade é uma precaução motivada pelo medo. A ditadura das redes sociais costuma ser mais do que intolerante, a prática do bullying e cancelamento existe, e provoca mais do que o medo.

Agradar a Todos

Em Romanos 15:3 está escrito (numa tradução mais ou menos livre ou sem autorização dos religiosos).

Porque também Cristo não agradou a si mesmo, mas, como está escrito: Sobre mim caíram as injúrias dos que te injuriavam.

Daí muitas pessoas interpretaram ou disseminaram a ideia de que “… Nem J. Cristo agradou a todos, eu não vou agradar a todos…”. Contudo, as redes sociais estão repletas de pessoas querendo agradar a todos, em grupelhos, e seguem na sua missão de neutralidade.

Agradar a todos é uma missão impossível, mas muitos desejam ter aceitação por todos em suas redes sociais. Pessoas que se passam por neutras buscam evitar ofender qualquer segmento de seu público. Assim sendo, evitam perder seguidores ou enfrentar críticas àquilo que eles professam e praticam.

O medo da rejeição social e a busca incessante pela aprovação são fatores determinantes para este tipo de neutralidade.

Privacidade e Opiniões Pessoais

Conheço muitas pessoas que têm opinião firme e com muita fundamentação sobre vários assuntos. Entretanto, em nome de uma privacidade, ao contrário do que faz o Chico César, preferem guardar para eventos e atividades do mundo real. Desse modo, estas pessoas se justificam como neutras nas redes sociais quando, na realidade, estão se resguardando.

É provável que estas pessoas tenham o desejo de manter suas opiniões políticas, religiosas, ou sobre temas sensíveis longe das redes sociais. Em certa medida, concordo e apoio a posição destas pessoas e não as classifico como do ditado popular ou como o fez Chico César.

É compreensível que elas considerem essas questões como posicionamentos pessoais que não devem estar em debate nas redes sociais. Portanto, ao optarem por uma postura aparentemente neutra estão agindo com racionalidade e preservação, atitudes raras na Internet. A preservação da privacidade e das opiniões pessoais, atualmente, é uma razão válida para a busca da neutralidade. Contudo, na maioria dos casos, essa postura pode ter várias interpretações, nem sempre benéficas para quem a pratica.

Pressão Social

É provável que seja a justificativa mais covarde e a de maior utilização no mundo moderno das redes sociais ditatoriais.

A pressão social desempenha um papel de alto grau de hipocrisia e falsidade na maneira como as pessoas se comportam nas redes sociais.

Alguém que sente a obrigação de se passar por neutro devido à influência de seu círculo social on-line ou off-line não é um bom caráter. O desejo de se encaixar em um grupo ou seguir a corrente predominante leva as pessoas à falsidade virtual e real. Desse modo, são facilmente desmascarados pelos seus próprios pares e a emenda fica pior do que o soneto.

Em suma, ocultar suas verdadeiras opiniões e adotar uma máscara de neutralidade por pressão de grupos, é uma espécie de miséria humana.

Obter Engajamento

Outra atitude deplorável dos neutros é se apresentarem com neutralidade para obterem engajamento (é  o termo da moda) incondicional. É provável que seja dos comportamentos mais sacanas para com a sociedade, ainda mais se rola alguma remuneração. O aprendiz de déspota, mostra-se neutro num assunto X ou Y, mesmo ele tendo opinião firme a favor ou contra. A neutralidade atrai várias pessoas e forma-se uma rede, a partir daí, essas pessoas compartilham tudo que vem do pseudoneutro.

Em um ambiente altamente competitivo como as redes sociais, a estratégia de ampliar o alcance e engajamento nem sempre é honesta. Assim sendo, algumas pessoas adotam essa postura aparentemente neutra para mostrar a sua opinião depois, com cuidado. Ao evitar tomar partido, de imediato, eles atraem seguidores de diferentes espectros ideológicos, aumentando seu alcance e visibilidade online. Desse modo, falsos criadores de conteúdo e posicionamento buscam aumentar seu público e monetizar seus perfis.

Falta de Consciência ou Reflexão

Surpreendentemente, o que mais provoca a neutralidade nas redes é a estupidez e a ignorância, stricto sensu.

Inquestionavelmente, a falta de consciência ou reflexão sobre questões polêmicas leva a maioria das pessoas a uma postura de neutralidade.

Em outras palavras, essas pessoas simplesmente não conseguem ter opiniões consistentes sobre a maioria dos assuntos. Desta forma, a neutralidade não é uma estratégia deliberada dos neutros, mas uma manifestação da falta de qualificação. Certamente, o pouco interesse nas questões em debate deve-se à incapacidade de reflexão sobre temas simples, que exigem foco e leitura.

As redes sociais, especialmente plataformas de mensagens instantâneas e de comunicação rápida degradam qualquer tentativa de conteúdo com qualidade.

Neutro e Profissional

A diferença entre ser neutro e ser profissional perdeu-se nas redes sociais, ou nunca esteve em questão. Já ouvi muito, de colegas profissionais, “… não sou de lado nenhum, sou profissional“. Desta forma, pude constatar na prática que este discurso é covarde e esconde elevado grau de conivência,

Temos que admitir que aqueles que se manifestam de forma aparentemente neutra, mas praticam em suas profissões, as suas preferências, são hipócritas. A falsa neutralidade é inimiga número um da transparência, inclusive nas organizações que padecem de hipocrisia e incompetência.

Um verdadeiro profissional deve fazer seu trabalho técnico e não se omitir nas opiniões e visões, inclusive técnicas. As redes sociais pariram uma elevada quantidade de “especialistas” em tudo, graças ao “Dr. Google“. Contudo, o que já denominamos como opinião de segunda mão(3), não serve nem de muleta para os que se dizem neutros.

Complexidade das Redes

A realidade complexa nas redes sociais e plataformas digitais determina que o opressor é aquele que “grita” mais e mente mais. Multidões que se passam por neutras têm diversas motivações subjacentes e explicações pouco convincentes. Desde que a pessoa escolha uma das “razões” anteriormente relacionadas, podemos caracterizar como neutros úteis.

Reconhecer as razões por trás da aparente neutralidade é crucial para uma compreensão das omissões e interações humanas nas redes sociais.

Em suma, nossa sociedade está sendo corroída por uma avalanche de neutros sociopatas. Com toda a certeza, eles se julgam mais capazes do que o idiota da aldeia de Umberto Eco na arte de simular comportamento. Infelizmente, a horda de neutros caminha (ou navega) para onde o vento os leva. São amorfos, condescendentes com uma incompetência nata, e estão no comando de muitos grupos, redes sociais e plataformas.

Será que o ponto de retorno está muito longe? Ou o fim do mundo chegará antes de um possível retorno à normalidade? qual normalidade mesmo?

 

(1) “Hipocrisia no comando

(2) “As redes sociais e o capataz digital

(3) “Entre sem bater – Mark Twain – Segunda Mão

 

Imagem: Entre sem bater – Chico César – Os Neutros

Nota do Autor

Reitero, dentre outras, o pedido feito em muitos textos deste blog e presente na página de “Advertências“.

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