Entre Sem Bater - Clarence Darrow - Ilusões

Entre Sem Bater – Clarence Darrow – Ilusões

Entre sem Bater

Este é um texto da série “Entre sem bater” (← Uma leitura, acima de tudo, “obrigatória”). A cada texto, uma frase, citação ou similar, que nos levem a refletir. É provável que muitas destas frases sejam do conhecimento de muitos, mas deixaremos que cada um se aproprie delas. Entretanto, algumas frases e seus autores podem surpreender a maioria dos leitores. É provável que Clarence Darrow, se voltasse ao planeta Terra, não acreditasse que seu pensamento sobre “Ilusões‘ fosse tão verdadeiro.

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As frases com publicação aqui têm as mais diversas origens. Com toda a certeza, algumas delas estarão com autoria errada e sem autor com definição. Assim sendo, contamos com a colaboração de todos de boa vontade, para indicar as correções.

Na maioria dos casos, são frases provocativas e que, surpreendentemente, nos dizem muito em nosso cotidiano. Quando for uma palavra somente, traremos sua definição. Por isso, em caso de termos ou expressões peculiares, oferecemos uma versão particular. Os comentários em todas as redes sociais podem ter suas respostas em cada rede e/ou com reprodução neste Blog.

Clarence Darrow

Podemos afirmar que Clarence Darrow era um dos visionários muito adiante de seu tempo? Certamente que sim, ser um causídico, no interior dos EUA, duzentos anos atrás devia ser uma tarefa ingrata. Entretanto, os pensamentos de Darrow estão vivos na forma como a nossa sociedade trata muitas coisas. As ilusões que as pessoas apresentam, atualmente, são as mesmas que Darrow descrevia como orador público.

Clarence Seward Darrow ( 18 de abril de 1857 – 13 de março de 1938) foi um advogado americano que se tornou famoso no século XIX por representações de alto nível de causas sindicais e, no século XX, por vários assuntos criminais, incluindo o julgamento do assassinato de Leopold e Loeb, o julgamento do “macaco” de Scopes e a defesa de Ossian Sweet. Ele foi um dos principais membros da União Americana pelas Liberdades Civis e um proeminente defensor da reforma econômica georgista. Darrow também era conhecido como orador público, debatedor e escritor. Foi considerado por alguns analistas jurídicos e advogados como o maior advogado do século XX. Postumamente, recebeu a honraria de estar no Hall da Fama dos Advogados de Julgamento.

Fonte; Wikipedia (Inglês)

ILUSÕES

Alguns temas, que aqui nesta trilha transformam-se em textos com a ideia de atualização e reflexão de pensamentos, são curiosos. Desta forma, falar de ilusões quando o mundo segue num crescente perigoso das fake news, parece ser coisa nova. Anteriormente, tratei do tema em diversas perspectivas e nem sempre obtive a compreensão dos leitores e não-leitores.

Quando abordei e recomendava o livro “Teia de Ilusões(1), a princípio uma ficção, as pessoas não viam nenhuma realidade. Por outro lado, em contraposição às ilusões sem limites, apresentamos a ideia de um sociólogo sobre “A Verdade(2). Surpreendentemente, a maioria dos leitores que se apresentam para algum debate, apresentam as suas versões para tudo. Assim sendo, ao usar um pensamento sobre a “Ilusão Maior(3), mais filosófica, as reações foram previsíveis.

Por isso, insistimos que as pessoas deveriam pensar mais fora da caixinha e de seu mundo hedônico e refletir. O pensamento de Darrow, à beira de uma cova(*), tem muito a nos oferecer para reflexão além de nós mesmos.

Oração Fúnebre

A frase de Darrow, repercute mais intensamente no presente, quando as ilusões se tornaram não apenas inevitáveis. Em outras palavras, ilusões tornaram-se um componente “essencial” da estrutura social e na vida de muitas pessoas. Em tempos de redes sociais, pós-verdade e fake news, as ilusões são uma espécie de motores do progresso. Ou seja, assim como venenos que minam a autenticidade do comportamento humano, as ilusões movem o mundo digital.

Mitos e Ideologias

As ilusões sempre tiveram um papel central na construção das civilizações e das sociedades antigas e modernas. Certamente, religiões, mitos e ideologias foram fundamentais para unir povos, e dar sentido à existência. Mesmo os avanços científicos e tecnológicos surgiram por ilusões coletivas. A crença no progresso infinito, na meritocracia e na racionalidade da sociedade, são exemplos atualmente. Sem essas ilusões, talvez ainda estivéssemos presos num estado de inércia, sem motivação para descobrir, criar ou inovar.

Contudo, na era digital, essa predisposição humana para acreditar na ilusão se tornou um problema avassalador. As redes sociais servem para maximizar engajamento e estimular emoções subliminarmente. Desta forma, transforma-se a mentira em um produto altamente rentável e ilusório. Em suma, as ilusões viram verdade para muitos e movimentam milhões em dinheiro e pessoas.

As fake news se espalham, de fato, seis vezes mais rápido do que notícias verdadeiras. E, notadamente, o consumo não é, exclusivamente, por ignorância, mas no viés de confirmação de crenças preexistentes. O ser humano não busca a verdade; ele busca narrativas que reforcem seus mitos, ideologias e ofereça uma segurança psicológica.

Perdemos !

O dano dessa dinâmica e realidade é profundo, perigoso e crescente. Certamente, em certas situações, a ilusão era um meio para alcançar um propósito maior, por uma coesão social ou para avanços de ideias. Agora, as ilusões tornaram-se fins em si mesmas, até algoritmos mantém as pessoas presas a bolhas ideológicas. Desta forma, reforçam os vieses cognitivos e o diálogo fica cada vez mais disfuncional. O que antes era um mecanismo evolutivo agora as fragmenta em tribos hostis e antagônicas.

Perdemos, como sociedade que pensa e é capaz de evoluir.

Como se não bastasse, a ilusão moderna não se limita à informação; ela se estende ao próprio comportamento humano. A era digital promove uma versão teatral da vida, onde a autenticidade submete-se à aceitação social. O indivíduo avança para construir um perfil ideal, para consumo de outrem, alimentando a ilusão de uma vida perfeita. A lógica da performance, do desejo de aprovação e do medo da irrelevância é predominante. Sem que as pessoas percebam, até as interações mais banais viram espetáculos ou exibicionismo de ilusões non sense.

Ativismo de Sofá

Os comportamentos do mundo digital apresentam efeitos psicológicos e sociais devastadores e sem possibilidade de reversão. A busca incessante por validação virtual gera ansiedade, depressão e crises de identidade. Ao mesmo tempo, cria uma cultura de superficialidade, na qual a aparência da virtude se sobrepõe à virtude em si.

Movimentos sociais e causas legítimas viram, frequentemente, gestos simbólicos vazios. Em outras palavras, o  “ativismo de sofá” relega a verdadeira ação política e social ao segundo ou terceiro plano.

Darrow, ao afirmar que o homem vive pelas ilusões, talvez não imaginou que essas ilusões um dia teriam sofisticação e onipresença. Se antes elas eram construções coletivas objetivando estabilidade e progresso da sociedade, hoje são commodities virtuais. Inquestionavelmente, corporações e governos, além de grupos de interesse, obtém o lucro e estão no controle. A verdade nunca foi um elemento central na vida humana, pois o ser humano sente-se desconfortável com ela. Contudo, nunca antes na história da humanidade, ela foi tão descaradamente submissa ao espetáculo da falsidade.

O ativismo de sofá produz seres mais do que imperfeitos e uns bobalhões que se declaram experts em teclados virtuais.

Segue o Jogo

Enfim, seria muito ingênuo sugerir que podemos ou devemos eliminar as ilusões completamente. A própria ideia de um mundo onde todos vivem apenas pela verdade é, ironicamente, uma ilusão. O que se faz necessário é uma reformulação crítica do papel que as ilusões desempenham em nossas vidas. Precisamos de uma alfabetização digital e midiática capaz de fortalecer a autonomia intelectual dos indivíduos. Desse modo, seria possível tornar as pessoas menos vulneráveis a manipulações e aos proselitismos vigentes.

Além disso, é fundamental resgatar a autenticidade como valor social. Isso significa criar espaços de diálogo onde a honestidade e a verdade, por mais incômoda que sejam, tenham espaço. Ou seja, onde o debate surja, sem a predominância do ódio e o medo de represálias. O desafio não é eliminar as ilusões, mas sim redirecioná-las para um propósito construtivo. Assim sendo, o avanço da sociedade deve ser possível sem corroer o caráter e a sanidade das pessoas.

A era das redes sociais e da desinformação nos colocou diante de um paradoxo. Vivemos, sem dúvida, tempos de acesso sem precedentes e sem limites à informação. Ao mesmo tempo somos mais suscetíveis à ilusão do que nunca e não sabemos filtrar a mesma informação. Cabe a nós, certamente, decidir se continuaremos reféns de narrativas ou se seremos capazes e queremos reconstruir tudo. A ponte entre a ilusão e uma verdade que, mesmo imperfeita, pode determinar o futuro da nossa sociedade.

 

Amanhã tem mais … 

P. S.

(*) A frase de Darrow fez parte de uma oração fúnebre para J. Howard Moore. Como Ray Ginger escreveu em ” Clarence Seward Darrow, 1857-1938 ” (1953), p. 60.

(1) “Teia de Ilusões – Uma Ficção Real

(2) “Entre Sem Bater – Bertolt Brecht – A Verdade

(3) “Entre Sem Bater – Fausto Pizani – Ilusão Maior

 

Imagem: Entre sem bater – Clarence Darrow – Ilusões

Nota do Autor

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