Entre sem bater – Vicente Toledano – O Patriotismo

Entre sem Bater

Este é um texto da série “Entre sem bater” ( ← Uma leitura, acima de tudo, “obrigatória” ). A cada texto, uma frase, citação ou similar, que nos levem a refletir. É provável que muitas destas frases sejam do conhecimento dos leitores, mas deixaremos que cada um se aproprie delas. Entretanto, algumas frases e seus autores podem surpreender a maioria dos leitores. É provável que a maioria das pessoas não veja “Patriotismo” num revolucionário marxista como Vicente Toledano.

Cada publicação terá reprodução, resumidamente, nas redes sociais Pinterest, Facebook, Twitter, Tumblr e, eventualmente, em outras isoladamente.

As frases com publicação aqui têm as mais diversas origens. Com toda a certeza, algumas delas estarão com autoria errada e sem autor com definição. Assim sendo, contamos com a colaboração de todos de boa vontade, para indicar as correções.

Na maioria dos casos, são frases provocativas e que, surpreendentemente, nos dizem muito em nosso cotidiano. Quando for uma palavra somente, traremos sua definição. Por isso, em caso de termos ou expressões peculiares, oferecemos uma versão particular. Os comentários em todas as redes sociais podem ter suas respostas em cada rede e/ou com reprodução neste Blog.

Vicente Toledano

O marxista mexicano que defendeu seu povo e sua nação, com todos atributos necessários ao verdadeiro patriotismo, foi um mártir. Certamente, sofreu com a incompreensão da maioria das pessoas e os ataques daqueles falsos patriotas, que se espalharam pelo planeta. Desde que faleceu, o que Toledano chamou de vida moderna, mudou muito, e seria interessante ele ver os exemplos que vivemos atualmente.

Vicente Lombardo Toledano (16 de julho de 1894 – 16 de novembro de 1968) foi um dos principais líderes trabalhistas mexicanos do século 20. Chamado de “o reitor do marxismo mexicano [e] o elo mais conhecido entre o México e o mundo internacional do marxismo e socialismo.”. Em 1936, fundou a Confederação dos Trabalhadores Mexicanos (CTM), a federação nacional dos trabalhadores mais intimamente associada ao partido no poder fundado pelo presidente Lázaro Cárdenas, o Partido da Revolução Mexicana (PRM). Depois de ser expurgado do sindicato após a Segunda Guerra Mundial, Lombardo Toledano cofundou o partido político “Partido Popular” com Narciso Bassols, que mais tarde ficou conhecido como Partido Popular Socialista.

Fonte: Wikipedia (Inglês)

Patriotismo

A sociedade moderna, de grandes transformações tecnológicas e culturais, testemunhou uma evolução sem precedentes nas últimas décadas. Contudo, ao analisarmos o conceito de patriotismo, observamos paradoxo obscuro para cada nação. Surpreendentemente, em vez de avançarmos com as ideias de pátria, povo e nação, retrocedemos séculos. Certamente, muitos problemas conceituais e práticos do falso patriotismo assolam não apenas o Brasil, mas diversas nações ao redor do mundo.

Há cinquenta anos, os patriotas se manifestavam por valores como unidade nacional, respeito pela Constituição e pontos aparentemente convergentes. A ideia de compromisso com o bem-estar da comunidade e uma noção de pertencimento sofria desvios invisíveis. É provável que, anteriormente, os meios de comunicação pouco democráticos determinavam as pautas nacionalistas facilmente,

Entretanto, atualmente, testemunhamos mudanças preocupantes nesses conceitos, com a liberdade de comunicação. Estas mudanças estão presentes em alguns problemas específicos e facilmente verificáveis.

Politização

Um dos problemas mais evidentes é a politização do falso sentimento patriota atuando nas mentes fracas e com má formação. Políticos mal intencionados (pleonasmo!) muitas vezes aproveitam o amor à pátria para seus próprios fins. Isso se traduz em discursos que apelam para o sentimento nacionalista, enquanto, objetivam ganhos pessoais e o poder político⁽¹⁾. No Brasil, por exemplo, vemos políticos que defendem agendas radicais e segregacionistas, em nome da pátria e da família. Desse modo, minam todas as possibilidades de qualquer convergência para uma unidade nacional.

“Nação é o povo com a consciência, a convicção do destino comum. A comunhão de interesses, que se estabeleceu nela, gera a convicção do destino comum e engendra entre os conacionais uma solidariedade insubstituível, uma lealdade no servir inviável fora da Nação.” (Montesquieu)

Defesa de Dogmas

A deturpação do sentimento patriota também se manifesta na defesa de dogmas inflexíveis em detrimento do debate e da evolução social. Em vez de promover o progresso e a adaptação às mudanças, alguns setores insistem em manter as pessoas no passado. Como se não bastasse usarem ideias que nunca funcionaram, insistem em não se alinhar com a diversidade e complexidade da sociedade moderna. Por isso, a resolução de qualquer problema torna-se um embate dogmático e sem o menor sentido. Desse modo, ocorre a alienação de grupos  e restrição da liberdade de expressão.

“Para o dogmatismo, o espírito de investigação é o mesmo que o espírito do mal.” (Ambrose Bierce)

Populismo e Manipulação

Outro aspecto crítico do patriotismo fora de contexto é o populismo e a manipulação da opinião pública. Qualquer pessoa, especialmente políticos, recorrem a estratégias demagógicas, explorando os sentimentos nacionalistas para conquistar eleições. Assim sendo, temos não apenas uma distorção da percepção da realidade, mas também enfraquecimento da democracia. Por isso, uma tomada de decisão, uma escolha de candidato ou posicionamento fica em desequilíbrio.

“Como temos tanta informação, mas sabemos tão pouco?”  (Noam Chomsky)

Divisões Sociais e Étnicas

O patriotismo genuíno deveria ser um fator de coesão social, mas observamos o efeito oposto nas manifestações atuais dos “patriotas”. Em muitas nações, incluindo e principalmente no Brasil, observamos divisões sociais e crescentes hordas segregacionistas. No lugar de celebrar a diversidade e a inclusão, os falsos nacionalistas marginalizam minorias e perpetuam estereótipos específicos. Desse modo, patriotas em desvio praticam homofobia, racismo, misoginia e outras formas de isolamento para quem não compactua de seus dogmas.

“Moralmente, a segregação é para mim uma injustiça básica. Desde que acredito que seja, devo tentar removê-la. Existem três maneiras pelas quais se pode lidar com uma injustiça. (a) Aceitá-la sem protesto. (b) Procurar evitá-la. (c) Resistir não violentamente. Aceitar é perpetuá-la.” (Bayard Rustin)

Os Desafios da Era Digital

A era digital trouxe uma avalanche de informações e uma transformação na forma como as pessoas se envolvem com questões políticas e sociais. Embora tenha o potencial de fortalecer o patriotismo autêntico, além dos problemas, também apresenta desafios únicos.

Três destes desafios são de conhecimento de todos aqueles que utilizam as modernas tecnologias de comunicação.

1. Bolhas de Informação

Um dos principais problemas da era digital é a formação de bolhas de informação, onde apenas as perspectivas e opiniões próprias existem. Assim sendo, tudo que não confirma as expectativas e ideias predominantes deve sofrer com a indiferença. Desse modo, limita-se a compreensão e determina a polarização, impossibilitando o desenvolvimento de um sentimento patriótico inclusivo e aberto.

2. Desinformação e Fake News

A disseminação de desinformação e notícias falsas é mais do que uma ameaça qualquer noção de sentimento nacionalista e de patriotismo. Notícias falsas e teorias conspiratórias frequentemente exploram falácias patriotas para criar divisões e promover agendas políticas. No Brasil e em todo o mundo, vemos como a desinformação mina a confiança nas instituições democráticas e todas as ideias de nação e povo.

3. Redes Sociais e Polarização

As redes sociais, embora tenham o potencial de conectar as pessoas e promover o engajamento cívico, servem mais à polarização. Os algoritmos que priorizam o conteúdo polarizador tomaram conta do planeta e das eleições. O caso do documentário “Privacidade Hackeada“⁽²⁾, por exemplo, mostrou como induzir as pessoas e as discussões. Desse modo, os debates se tornam estéreis, pueris e violentos, e os efeitos pouco ou nada construtivos. Por isso, o afastamento das pessoas enfraquece qualquer sentimento nacionalista ou patriótico consciente.

O Caminho, A Verdade

Se existe a mais remota possibilidade de se buscar o resgate dos ideais de igualdade, liberdade⁽³⁾ e fraternidade, alguns preceitos devemos seguir. A partir dos problemas e desafios é crucial buscar a educação de valores democráticos, inclusão social e respeito mútuo.

Desta forma, algumas diretrizes para restaurar e fortalecer o verdadeiro sentimento de nação e pertencimento do povo podem ser:

1. Educação Cívica

Investir em educação cívica é fundamental para promover alguma espécie de nacionalismo e patriotismo. Os cidadãos devem compreender os princípios democráticos, a Constituição e a importância do debate público com boa instrumentalização. Desse modo, será possível a todos discernir entre o verdadeiro civismo e empulhação eleitoral.

2. Combate à Desinformação

Os governos, as empresas de tecnologia e a sociedade civil devem colaborar para combater a desinformação e as notícias falsas. Isso inclui promover a alfabetização digital e a verificação de fatos, além de responsabilizar os propagadores de desinformação.

3. Inclusão e Diversidade

Promover a inclusão e a diversidade é essencial para construir uma democracia inclusiva e participativa. Em outras palavras, deve-se considerar e valorizar todas as identidades culturais, étnicas e sociais presentes em uma nação. O respeito à diversidade fortalece a coesão social e o ideal de pertencimento.

4. Compromisso com Valores Democráticos

A verdadeira democracia alinha-se com preceitos como: Estado de Direito, Liberdade de Expressão e a Justiça Social. Os verdadeiros líderes políticos são responsáveis ​​na defesa e promoção desses princípios, em vez de miná-los em nome de um “patriotismo”.

Compromisso

Enfim, nossa sociedade moderna (não a de Vicente Toledano) enfrenta desafios complexos em relação ao conceito de patriotismo.

A politização, a manipulação, a polarização e a desinformação são ameaças à promoção da coesão e do bem-estar da nação.

“O que não for bom para a colmeia também não é bom para a abelha.”

“A injustiça que se faz a um, é uma ameaça que se faz a todos.”

“O pior governo é o que exerce a tirania em nome das leis e da justiça.”

Montesquieu

No Brasil, e no mundo, é crucial que os cidadãos e líderes políticos assumam o compromisso de lutarem por sua nação e seu povo. Restaurar, no caso do Brasil é criar mesmo, pois nunca existiu de fato, um patriotismo real; é complexo e quase impossível. É provável que, a partir de valores democráticos fundamentais, como inclusão e respeito mútuo, seja possível.

Desse modo, poderemos superar os problemas conceituais e práticos do falso patriotismo e construir um futuro mais justo para todos.

 

⁽¹⁾ “Entre sem bater – Karl Marx – Poder Político”

⁽²⁾ “Privacidade Hackeada”

⁽³⁾ “Entre sem bater – Mikhail Bakunin – A Liberdade”

 

Imagem: Entre sem bater – Vicente Toledano – O Patriotismo

Nota do Autor