Mistura perigosa
Religião e política são como a água e o azeite, não podem misturar no mesmo contexto, o resultado nunca será melhor do que se tomados isoladamente. No Brasil, adicionaram o futebol num dito popular que cheira muito mal e tem servido a déspotas esclarecidos e seus vassalos.
Diz o ditado que “… política, futebol e religião, não se discute ….”, o que, com toda a certeza, é uma falácia para impedir qualquer discussão ou debate mais racional.
Devemos debater tudo, inclusive política, futebol e religião, entretanto, não tenho exemplos de debatedores que ao misturar os temas, consigam bons resultados. E, com toda a certeza, religião e política são dois temas que se usados para unir qualquer argumento, já começa errado, historicamente e na fundamentação.
Religião e política
Em primeiro lugar, até a precedência das duas palavras suscitam grandes debates do tipo, a religião influencia a política ou o contrário. Erro crasso em todos os debates e que, na prática, revela muito dos dogmas ou tipo de debate que cada contendor quer direcionar. Algum tempo atrás, quando falei sobre os poderes instituídos em um Estado-Nação(1) fiz valer as premissas de Montesquieu. Até então, as civilizações antigas não haviam experimentado a independência de ideias e o debate. A ciência é uma fonte de conhecimento que nunca foi bem aceita pelos negacionistas, que queimavam hereges com suas ideias.
É impossível para quem tem o viés do debate sobre a política aceitar que a discussão seja pautada pela religião, e vice-versa. Uma forma de ter algum tipo de debate é fazendo um resgate histórico que remonta à Grécia Antiga e aos filósofos.
O curioso é que as minhas teorias sobre debater e abordar o tema religião e política, separadamente, nunca encontram nos debatedores, algum respaldo. Não raramente, participamos de algum tipo de debate em que estes parâmetros (separação das ideias e temas) seja convergente. E, desse modo, quando isso ocorre, a conversa é bem mais pacífica.
Dividir para conquistar
Um conceito presente em grandes estrategistas, diante de uma guerra – o debate de ideias é uma guerra – é que faz-se necessário dividir para conquistar (avançar).
Assim sendo, seria natural pensar separadamente sobre a religião e a política, pois do entendimento de como evoluíram ambas, torna-se possível entender o mundo em que vivemos.
É provável que qualquer pessoa, em qualquer ambiente ou espaço, ao não admitir esta separação, dê os ombros para o que diz o debatedor que tenta a separação. Em outras palavras, a turma do ” … tenho opinião formada, não quero saber de fatos e não mundo minha opinião …” ouve tudo mas não escuta nada.
Com o advento de novas tecnologias e redes sociais, fica ainda pior e o “… pode falar que estou ouvindo …” representa a indiferença e intolerância. Nossa sociedade evoluiu, infelizmente, nossa sociedade utiliza-se de conceitos e dogmas da Idade Média como se fosse algo normal. O exemplo dos negacionistas, dos defensores da terra plana, dos antivacinas estão aí, para provar minhas hipóteses.
Preconceito
Quando se mistura religião e política, os níveis de preconceito, intolerância e indiferença ficam realçados. A opinião que manifesto há muito tempo é corroborada até por estudiosos como Marcelo Gruman que disse: “Quando religião e política se misturam, o resultado é desastroso, seja onde for: no Brasil, na Arábia Saudita ou em Israel“.
Se concordo com o antropólogo Gruman na essência, afirmo que no Brasil a coisa não funciona assim e pode terminar até em pizza.
Entretanto, existem algumas vertentes que tentam diferenciar alguns conceitos para justificar que religião e política se misturam. Os defensores de acepções das palavras religião, política, Estado e Igreja tentam fazer com que coisas etéreas desçam ao mundo real e assim elas podem se misturar. Analogamente à questão da democracia – onde defendo a opinião de que, no Brasil, vivemos uma democracia guiada – temos aqui um tipo de falácia que é a falsa definição de termos para provocar diversionismo e conduzir o debate.
Entendo que ao tentar separar religião de Igreja e política de Estado, ignorando as culturas, as manifestações de organização de uma nação não vinculadas à religião, ignora-se que existe um mundo além da escolha de uma religião e de uma posição política.
Pátria, Nação, religião e política
Ao se agregar as palavras pátria e nação, às já mencionadas política, religião, Igreja e Estado podemos ter uma infinidade de variáveis e nenhuma define a outra, qualquer que seja a relação.
As tentativas de se rebaixar o debate a partir de preconceitos e definições pré-concebidas tem sido exitosa em redes sociais onde “block” determina tudo. A função “silenciar” alguém que você não quer saber de uma opinião deve ser a função mais acionada nas redes sociais de mensagens instantâneas, mais até do que excluir.
É compreensível que aqueles que defendem a união de religião e política estejam querendo a volta do estado secular, aquele das monarquias ungidas e protegidas pela Igreja. É claro que estes déspotas esclarecidos contam com seguidores que pensam como eles pois “rezam” na mesma cartilha, desde que a religião deles esteja no comando.
Brasil hoje e amanhã
O Brasil vive um grande dilema que o político Leonel Brizola vaticinou: a perdição do Brasil será quando a religião tomar conta do país. Já estamos sob a égide de uma era dos “terrivelmente evangélicos” tomando conta do STF e transformando um país laico em uma republiqueta de púlpitos e bananas.
É necessário excluir a mistura da política e deixar a religião para os templos e igrejas, deixar futebol para as arquibancadas e botecos. A política pode estar nos botecos, arquibancadas e praças, onde o povo estiver. Aqueles que adoram seus deuses ou um só deles, que juntem-se aos seus iguais e parem com o proselitismo absurdo e a ditadura que tentam impor aos demais.
Nacionalismo tem a ver com nação e pátria e não com um Deus ou um livro, seja ele a Bíblia, Alcorão ou qualquer outro. Estamos num mundo em que buscar definições das palavras num dicionário, como se isso resolvesse qualquer debate, é pueril. Palavras de dicionário possuem acepções diferentes e, assim sendo, quando colocadas num determinado contexto, mudam tudo, mudam o mundo, só não mudam mentes.
O Brasil está numa encruzilhada mais do que perigosa, quando mistura política com religião e, definitivamente, o brasileiro mediano(*) não está preparado. #MAKTUB !
P. S. Caso o nobre leitor tenha um exemplo para comprovar que a mistura de política e religião tenha dado certo, cartas à redação, pro favor.
(1) “Revisitando Montesquieu no Século XXI”
(*) Certamente, não devemos confundir o brasileiro mediano ou medíocre com o analfabeto político.
Imagem: Reprodução Internet
Nota do Autor
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