A trincheira Azul numa guerra sem santos

Guerras

Vivemos tempos difíceis. As guerras se apresentam de várias formas. Vivenciamos, atualmente, uma guerra entre nações (Rússia x Ucrânia) repleta de desinformação. Estamos superando uma guerra contra um vírus que apresentou até defensores contra a paz (uma vacina). E travamos uma guerra por ideologia em que as pessoas lutam contra a ignorância. Enfim, a necessidade de se escolher uma trincheira ou um lado para estar, pode ser pior do que a própria guerra.

Hemingway (poeta estadunidense) disse que “Não importa quão necessária ou justificável seja uma guerra, ela será sempre um crime.”. A partir daí, surgiu um pensamento adaptado a uma de suas obras. E, esta outra frase, não dita por Hemingway, serve como uma luva aos tempos atuais. O pensamento pode ser, primordialmente, direcionado aos cruzeirenses que buscam uma trincheira para aderir.

Desse modo, este texto é sobre a possibilidade de que alguns cruzeirenses, poucos, possam não aceitar esta ou aquela “trincheira”. A guerra fratricida em que nos metemos vem de longa data.

Escrevi, exatamente 90 dias atrás⁽¹⁾, um pouco desta guerra e sobre o Cruzeiro ter um dono.

Trincheira Azul

Em primeiro lugar, não tenho bola de cristal e, eventualmente, minha opinião não coincide com nenhum dos “lados” numa guerra. Foi assim em 2011 e em janeiro de 2018 quando vi que a ascensão de um determinado grupo não ia dar certo no Cruzeiro. Quando escrevi sobre o tema, no final de 2017⁽²⁾, falei sobre a opção do torcedor cruzeirense em continuar sendo ignorante. Com toda a certeza, ignorante na acepção de preferir ignorar os fatos e preferir as opiniões. Em outras palavras, a ruína do Cruzeiro tem muito a ver com as escolhas de lado que todos têm feito.

Acredito que seja direito de qualquer um adotar a opção em cima do muro. Entretanto, quem fica em cima do muro deve ter a coragem de admitir a ignorância, ser omisso ou apresentar uma opinião. Por outro lado, quem assume alguma opção de qualquer lado das trincheiras deve tentar ao menos pensar em tudo. Sem bem que pensar parece não ser o esporte favorito do torcedor de futebol nas redes sociais.

As trincheiras

Desde que a assembleia que redefiniu o Estatuto do Cruzeiro, autorizando a venda de 90% do clube para transformação em SAF, ocorreu, passaram-se 90 dias. Mesmo antes da assembleia, comecei a escrever um texto sobre o futuro e a SAF. Entretanto, verifiquei que era necessário a assinatura do acordo definitivo e uma isenção em relação às iniciativas em outros clubes. Com toda a certeza, cada realidade destes clubes é diferente e muitos torcedores não querem entender isso.

Como passaram-se os noventa dias, o acordo não desenrolou, as dúvidas só aumentam. A ótima performance do clube nos remete a uma agitação na mídia, e dos influencers, como se tudo estivesse correndo às mil maravilhas. Nesse ínterim, surge a questão dos centros de treinamento e da dívida. A mídia repercute aquilo que lhe dá audiência e, desse modo, a roupa suja é exposta, antes da lavanderia abrir as portas. Assim sendo, surgem duas trincheiras de uma guerra que não é da torcida ou pelo menos a torcida deveria se manter distante.

Nesse mundo de redes sociais rápidas, nenhum torcedor quer se manter equidistante. Certamente 99% da torcida tem opinião formada e escolheu uma trincheira.

Trincheira SAF

É formada por XP Investimentos, Tara Sports, seu staff capitaneado por R9 e os investidores e acionistas da empresa com sede em Madrid. Por conta da ótima performance em campo, esta trincheira arregimentou a maioria das redes sociais, especialmente no Twitter. Como se não bastasse, suas ações, mesmo aquelas cheias de equívocos, obtém o menosprezo do torcedor, em função dos resultados em campo,

É a trincheira que domina a opinião pública e quando o R9 diz que “posso desistir“, aquilo aflora o desespero do torcedor. Certamente, este torcedor não estava preparado para a guerra.

Trincheira PJO

Em primeiro lugar, chamo de PJO tudo aquilo que ficou para trás no dia da venda do Cruzeiro (que ainda não se concretizou). Desde a criação  da SAF (início de dezembro), o Cruzeiro PJO não existe mais para o futebol. São estes os fatos. A trincheira do Cruzeiro PJO é vista pelo seu Conselho Deliberativo. Em outras palavras, não interessa a história centenária do Cruzeiro Esporte Clube, é passado.

Surpreendentemente, esta trincheira só é vista pelos torcedores pelo que tem de ruim. Na condição de sócio do clube, tenho a certeza de que existem ótimos e probos conselheiros. Alguns estão na resistência e nesta trincheira,

Torcida

A torcida está, em sua grande maioria, em total desespero pela permanência na Série B. Esta posição foi prevista por mim, há algum tempo,  e confirmada pelo sucesso do rival citadino. Desse modo, o ano de 2021 foi crucial para o aumento do desespero deste torcedor que não reaprendeu a torcer. A zoeira que o torcedor do Cruzeiro praticava evaporou-se. Primeiro foi o “nunca caí“, depois o “não tem bi“. A crueldade foi maior quando ganharam uma Tríplice Coroa e construíram um estádio. Esta grande parcela da torcida está desesperada para que não aconteçam mais “tragédias” e escolhe sua “tábua de salvação”.

A trincheira azul fratricida

Assim como em todas as guerras, não existe imparcialidade. Surpreendentemente, vemos que as pessoas não estão parando para pensar no que motiva guerra. No caso da guerra fratricida do Cruzeiro, a maioria dos torcedores prefere ter opinião formada.

Desta forma, o diálogo, equivocadamente, atribuído a Hemingway, serve para o Cruzeiro e o seu torcedor.

– Cruzeirense, qual das trincheiras você vai escolher?

– E, isso importa?

Digo que importa muito, mais do que as motivações da guerra e quem está no comando.

Torcedor que não conhece as motivações e escolhe um lado é, analogamente à guerra Rússia x Ucrânia, um tolo.

Mídia e Redes Sociais

Desde que as divergências da diretoria se apresentaram (muitos anos atrás), os fatos narrados pela mídia e redes sociais criaram trincheiras diferentes. A mídia sabe de muitas coisas e não publica, pois a mídia tem um lado e suas motivações. Como se não bastasse, as redes sociais ganharam os tais influencers remunerados e seus seguidores fieis.

Estamos no meio de uma guerra muito suja e que só interessa a quem vende as armas para os outros se matarem. Acabar com a mídia ou determinar o que ela escreve não é solução. Colocar a cabeça dos influencers para fora das trincheiras e casamatas é inútil, pois surgem perfis a cada segundo.

Em suma, o torcedor só tem uma saída: se informar o máximo possível, e, certamente, questionar tudo e todos.

Fico desanimado é quando apresento a minha opinião, questionando qualquer uma das trincheiras e os ataques ficam pessoais. Revela que o torcedor do Cruzeiro, definitivamente, não está preparado para ter certas conversas.

SAF Azul

Os próximos dias prometem e a ameaça feita através do R9 pode revelar até quem tem mais interesse em comprar o Cruzeiro. Pode ainda revelar se o contrato entre Cruzeiro PJO e Tara Sports infringe algum artigo da Lei da SAF.

Não entro em guerra de notas entre a Mesa Diretora , Sérgio Rodrigues, a XP Investimentos ou quem quer que seja. Alguns torcedores têm se manifestado reservadamente e pedido minha opinião sobre trechos das diversas notas. Sou totalmente contrário a formar opinião quando uma ou as duas trincheiras emitem comunicados. Como se não bastasse, é criminoso o diversionismo da mídia e influencers quando arguem uma possível “quebra de confidencialidade”. Parece que, para não responder a questões objetivas, usam deste tipo de muleta jurídica como defesa prévia de algum crime. Menos, bem menos, pois nem todo mundo é teleguiado na torcida do Cruzeiro.

Existe solução?

Certamente que sim, mas não temos (os torcedores) nenhuma arma, muito menos a virulência das redes redes sociais. Por outro lado, os arroubos de alguns perfis e influencers só aumentam a ignorância e irracionalidade coletiva.

Enfim, não estou ao lado de nenhuma trincheira pois como em muitas guerras, é difícil ser imparcial, mas é necessário. E, afinal, as analogias sobre irmãos de armas, guerra e afins, tem algum sentido racional?

Sou da paz e torcedor do Cruzeiro.

 

⁽¹⁾ “O futuro do Cruzeiro foi ontem“.

⁽²⁾ “Torcedor Cibernético – Ser Ignorante”

 

P. S.

Estou com acúmulo de textos não-publicados sobre o Cruzeiro. Aguardo, essencialmente, assinatura de um contrato definitivo com o adquirente dos 90% da SAF. As últimas 24 horas e os questionamentos que tenho sofrido, levaram a esta publicação.

 

Imagem: Cruzeiro Divulgação

Nota do Autor