Entre sem bater - Florestan Fernandes - A Neutralidade

Entre sem bater – Florestan Fernandes – A Neutralidade

Entre sem Bater

Este é um texto da série “Entre sem bater” ( Uma leitura, acima de tudo, “obrigatória” ). A cada texto, uma frase, citação ou similar, que nos levem a refletir. É provável que muitas destas frases sejam do conhecimento dos leitores, mas deixaremos que cada um se aproprie delas. Anos depois da morte de Florestan Fernandes, a “Neutralidade“, certamente, não existe no pensamento de ninguém. .

Cada publicação terá reprodução, resumidamente, nas redes sociais Pinterest, Facebook, Twitter, Tumblr e, eventualmente, em outras isoladamente. Uma adaptação textual, com redução, pode ter publicação em sites e outros blogs, como o “Recanto das Letras“.

As frases com publicação aqui têm as mais diversas origens. Com toda a certeza, algumas delas estarão com autoria errada e sem autor com definição. Assim sendo, contamos com a colaboração de todos de boa vontade, para indicar as correções.

Na maioria dos casos, são frases provocativas e que, surpreendentemente, nos dizem muito em nosso cotidiano. Quando for uma palavra somente, traremos sua definição. Em caso de termos ou expressões peculiares, oferecemos uma versão particular. Os comentários em todas as redes sociais podem ter suas respostas em cada rede e/ou com reprodução neste Blog.

Florestan Fernandes

Florestan Fernandes foi um personagem da história do Brasil que, atualmente, teria o rótulo, nas redes sociais, de esquerdista. Era, com toda a certeza, um humanista, e não está fácil para qualquer um se apresentar como tal. São os tempos modernos em que pessoas como Florestan fazem falta, até para defender seus conacionais.

Florestan Fernandes (São Paulo, 22 de julho de 1920 – São Paulo, 10 de agosto de 1995) foi um sociólogo brasileiro. Patrono da sociologia brasileira sob a lei nº 11 325, Florestan é um dos intelectuais brasileiros mais influentes do Século XX, e em seu nome foram batizados auditórios, escolas, centros de estudantes e bibliotecas, como a da Universidade de São Paulo, e diversos edifícios públicos. Florestan teve uma trajetória peculiar para um acadêmico brasileiro: de origens humildes, trabalhou desde a sua infância, como engraxate e garçom enquanto cursava a escola primária. Segundo ele, sua formação acadêmica nunca se sobrepôs que ele chamou de sua formação humana, adquirida nas relações pessoais por trabalhar durante sua infância e adolescência. Ele produziu uma sociologia crítica que atravessou as paredes da universidade e o acompanha numa vida de intenso debate público e militância política. Também foi deputado federal pelo Partido dos Trabalhadores, e participou da Assembleia Nacional Constituinte. Recebeu o Prêmio Jabuti em 1964, pelo livro Corpo e Alma do Brasil e foi agraciado postumamente em 1996 com o Prêmio Anísio Teixeira.

Fonte: Wikipedia (Português)

Neutralidade

A discussão da neutralidade sempre remete à questão de como as pessoas se posicionam diante de acontecimentos ou de fatos. Atualmente, em função das bolhas em que as pessoas se meteram, até os neutros(1) têm medo de se posicionar. E, como se não bastasse, correm o risco de sofrerem ataques da direita, do centro e até da esquerda.

Desse modo, é essencial demonstrarmos que a neutralidade deveria se apresentar como deve ser, e não como a multidão(2) deseja.

A importância da assertiva de Florestan reside na capacidade, em falta atualmente, das pessoas em separarem as ideias, as coisas e as pessoas. Por isso, devemos entender mais sobre a inexistência da neutralidade no pensamento. Certamente, é o caminho para compreender a luta dos opressores sobre os que sofrem a opressão, na vida real e nas redes sociais.

Inquestionavelmente, nas redes sociais, a escolha de um lado é muito transparente e clara, inclusive dos editores nos grupos e plataformas. Os usuários que compartilham conteúdos que denunciam as injustiças sociais estão entendendo e sofrendo com a opressão. Por outro lado, os que compartilham conteúdos que defendem o status quo escolhendo o lado dos opressores.

Neutralidade do Pensamento

A neutralidade, em termos gerais, tem muita aplicação em narrativas e discursos pseudopolíticos. Com toda a certeza, Florestan disse que  a neutralidade no pensamento não é possível e pode contaminar os discursos que as pessoas querem ouvir. Qualquer pessoa deveria saber como se posicionar e fazer leituras sobre o discurso de qualquer outro.

Polarização Política

A perspectiva da neutralidade, quando tem aplicação junto à polarização política nas redes sociais nem deveria existir, mas alguns déspotas ainda insistem. Na era digital, a luta entre os que oprimem e os que sofrem opressão se desdobra em debates estéreis, com pouca ou nenhuma neutralidade. E, surpreendentemente, os espaços digitais apresentam-se como se a maioria dos debatedores e comentaristas fossem neutros.

Na mídia, por exemplo, os comentaristas, com raríssimas exceções, escondem suas preferências políticas, futebolísticas e religiosas. Inquestionavelmente, não querem expor que possuem um lado e escolheram de forma conveniente. Enfim, quanto mais palanque, púlpito ou canal digital uma pessoa tem, menos neutro ele é.

No Brasil, a polarização política intensifica-se, transformando plataformas digitais em campos de batalha ideológica. Adicionalmente, as plataformas e grupos tornaram-se cabos eleitorais e instrumentos da pior propaganda política, onde a neutralidade inexiste. Nesta terra de ninguém, cada usuário se posiciona, consciente ou inconscientemente, ao lado dos oprimidos ou dos opressores.

Arenas Ideológicas

As redes sociais, que deveriam ser espaços de conexão e compartilhamento de ideias, tornaram-se arenas ideológicas.

Em outras palavras, todas as divergências ideológicas e dogmáticas ali se manifestam de maneira erráticas e através de arroubos. Nesse contexto, a escolha das pessoas é previsível, a neutralidade inexiste e a irracionalidade ganha espaço. As narrativas, de qualquer natureza, se entrelaçam com as experiências individuais, transformando as discussões numa babel. E, surpreendentemente, qualquer tentativa de se mostrar alguma neutralidade, tem condenação imediata como se fosse conivência ou apatia.

Contudo, ao analisar a maioria dos debates, fica evidente que cada interação carrega consigo as marcas das escolhas:

  • apoiar ou resistir;
  • endossar o status quo ou questioná-lo;
  • omitir-se ou fazer cara de paisagem.

A luta entre os protagonistas de cada conteúdo, no ambiente virtual, revela-se através das postagens, compartilhamentos e comentários. Qualquer simples análise do discurso, identifica atualmente a polarização política que permeia a sociedade brasileira.

As arenas ideológicas digitais são, sem dúvida, um espaço que os humanos normais e anormais, estão em segundo plano. Assim sendo, uma arena virtual transforma-se num campo de batalha onde as palavras e algoritmos são armas e a neutralidade é uma traição.

Algoritmos

O fenômeno da polarização sofre influência vertiginosa dos algoritmos que favorecem a exibição de conteúdos que alinham-se às crenças preexistentes. As bolhas ideológicas se formam, restringindo a exposição das perspectivas divergentes e perpetuando a polarização estéril. Dessa forma, a neutralidade some entre o relato de fatos, os acontecimentos e as opiniões.

Desse modo, a possibilidade de escolha entre os lados, diminui a cada interação online e a cada “aprendizagem” dos algoritmos dos aplicativos.

As redes sociais constroem identidades políticas de acordo com o alinhamento dos discursos, em função de convicções e dogmas.

Algoritmos são especialmente hábeis para se apropriar da linguagem das postagens e comentários dos usuários. Se, anteriormente, a mídia e seus comentaristas reproduziam aquilo que os ouvintes queriam, agora chegou a vez dos influenciadores. Mais do que frequentemente, ou quase sempre, as narrativas destes personagens aderem emocionalmente às próprias causas.

Fenômenos Modernos

A noção de oprimidos e opressores, tão presente no pensamento de Florestan Fernandes, manifesta-se de maneiras diversas nas redes sociais. O que anteriormente precisava contar com a mídia, o governo ou as oligarquias, ganhou vida com a evolução das tecnologias. Como disse um certo sociólogo, o idiota da aldeia(*) saiu da mesa do boteco e ganhou o mundo com a sua ignorância. Surpreendentemente, descobrimos que estes sociopatas não são poucos, e estão vencendo por serem maioria.

De um lado, grupos marginalizados encontram nas plataformas digitais um espaço para dar voz às suas lutas. Por outro lado, aqueles que manipulam as instituições, utilizam-se da sua influência para manterem-se perto do poder. A polarização, portanto, é não apenas uma questão de ideias, mas também de poder, aparências e representação.

A falta de neutralidade nas redes sociais é agressiva pela rapidez com que as informações, nem sempre verdadeiras, circulam. Notícias e opiniões têm compartilhamento em tempo real, sem que tenham diferenciação de fato ou versão. Desse modo, cria-se uma dinâmica em que os atores (reais ou falsos) sentem uma motivação para se posicionarem de chofre. Essa pressa favorece a adesão a discursos ambíguos e inexatos. Sendo assim, a reflexão e a ponderação sofrem imolação em prol da instantaneidade e mediocridade.

Desta forma, afirmamos que o fenômeno das fake news, que distorcem a realidade e reforçam narrativas partidárias, é algo sem retorno. A disseminação de informações falsas sem controle cria um ambiente propício para a manipulação e a radicalização. As pessoas, muitas vezes sem perceber, contribuem para a propagação dessas versões e falsidades.

É, em suma, a adesão àquilo que elas querem acreditar e que apresenta-se de maneira mais fácil para compartilhar ou copiar e colar.

Perspectivas

É importante destacar que a inexistência da neutralidade não implica a ausência de perspectivas nas discussões online.

Existem guetos ou vozes dissidentes ou dissonantes das hordas de estultos que são a maioria em redes como Twitter e outras. Com toda a certeza, muitas complexidades do mundo real podem sofrer reduções simplistas e autoritárias de grupos, redes sociais e mídia. A guerra ideológica digital apenas começa no planeta, mas apresenta sinais de perigo a cada eleição no Brasil.

Desde que as redes sociais se manifestaram por aqueles malditos R$0,20, o país nunca mais foi o mesmo e dividiu-se irreversivelmente.

A pressão para que as pessoas se alinhem a um dos polos predominantes obscurece tudo, perpetuando uma visão binária da realidade.

Em suma, as redes sociais no Brasil são palcos insanos de uma intensa luta ideológica, onde a polarização política avança diante de olhares inertes.

Pressiona-se para que as pessoas façam suas escolhas de lado. O desafio para os usuários das redes sociais é cultivar uma consciência crítica, buscar a compreensão além das narrativas. Enfim, é necessário reconhecer que a riqueza do pensamento reside na capacidade de abraçar a diversidade e ter um novo fim(3).

O mundo de Florestan, de acadêmicos e intelectuais, agora é de quem tem ou não tem um smartphone, e “Amanhã tem mais …

P. S.

(*)  A expressão seria de autoria de Umberto Eco, entretanto, deve ser algum aforismo, paráfrase ou tradução sem neutralidade.

(1) “Entre sem bater – Chico César – Os Neutros

(2) “Entre sem bater – Chico Buarque – A Multidão

(3) “Entre sem bater – Chico Xavier – Um Novo Fim

 

Imagem: Entre sem Bater – Florestan Fernandes – A Neutralidade 

Nota do Autor

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